2

COMO TRANSFORMAR UMA TARDE CINZENTA EM UMA NOITE ENSOLARADA

Posted by Clenio on 02:08 in
Para ler ouvindo "Para um amor no Recife"...

Era uma tarde mormacenta, com nuvens encobrindo um sol acanhado e um calor abafado que denunciava o verão mas não o explicitava em cores. A chuva caía tímida, sem força suficiente para causar barulho ou refrescar corpos que, como o meu, imploravam por uma brisa além da proporcionada por ventiladores ou ar-condicionados. Era, sem sombra de dúvida, um domingo que prometia nada mais do que vinte e quatro horas de tédio suarento e uma leve ressaca de uma noite de excessos alcóolicos. Mas o que é a vida senão uma sucessão de acontecimentos aleatórios e inesperados que conduzem a desfechos invariavelmente irônicos?

Quando o telefone tocou, o prefixo não me revelou nada, exceto que se tratava de um número desconhecido de outro estado. A voz, no entanto, me trouxe à lembrança momentos divertidos da noite anterior, que eu julgava acabada e parte de um passado já distante. A voz, dona de um sotaque sonoro e quente, me convenceu a abandonar a preguiça e, levantando o corpo do sofá, me joguei debaixo do chuveiro para uma tarde que, no mínimo, seria diferente: o que mostrar de Porto Alegre a quem não conhece a cidade? Dúvida um tanto cruel: eu mesmo não a conheço tanto quanto deveria.

Calor, chuva e nada de carro. Criatividade, apenas, e a vontade de proporcionar horas agradáveis a um "estrangeiro". E lá fui eu, mostrar a ele os pontos turísticos que as pernas permitiam. A chuva intermitente não permitiu o passeio de barco pelo Rio Guaíba, mas não atrapalhou a visita à igrejas. Nem me fez desistir da ideia de mostrar a vista do Café da Casa de Cultura Mário Quintana, com sua abóbada clássica e repleta de histórias. Foi ali, no café, que realmente começamos a conversar. E foi ótimo. Rimos, contamos passagens de nossas vidas, explicamos um ao outro algumas diferenças culturais (não, a água que acompanha o cafezinho não é pro santo, pode beber sem medo...) E fomos visitar o centro histórico da cidade.

Assembléia Legislativa, Palácio Piratini, Catedral Metropolitana, Palácio da Justiça, Multipalco do Theatro São Pedro vistas de maneira menos corriqueira, porque menos corrida e mais, por que não?, romântica.... O céu não decidia entre abrir-se ou fechar-se, mas estar bem acompanhado alguns metros acima do chão não deixa de ser uma experiência que, independentemente do tempo, é inesquecível. Mais calor e a busca por ar-condicionado nos levou ao subterrâneo: uma praça de alimentação deserta de um shopping nada memorável. Mais conversa, mais risadas, eu completando as frases que saíam de sua boca, sua boca me tentando...

E eis que o sol finalmente resolve aparecer. São seis horas da tarde, e está muito calor. Não queremos nos separar e vamos passar por uma experiência inédita: um samba carioca em um boteco de paulistas. Os amigos chegam, os copos de cerveja (muitos) secam, a música contagia e o sol não dá sinal de querer ir embora. Sim, aqui em Porto Alegre, no horário de verão, as noites são ensolaradas, principalmente quando estamos felizes. Risadas mil, alguns beijos tímidos e a noite propriamente dita começa a chegar. Tento convencer o nordestino arretado e querido ao extremo - com a ajuda dos novos fãs arrebatados por ele - a que estendesse sua estadia por mais uma semana, com a programação já toda delineada. E a noite, felizmente, não acaba.

E vamos comer cachorro-quente na República (mais um ponto turístico indispensável), mas já é madrugada e a vida diária inicia a chamar, inclemente. Meus olhos já estão vermelhos de sono, mas meu corpo não quer abandonar o seu. Seu cheiro, sua voz e sua personalidade me fascinam, mas infelizmente o tempo está acabando para nós. Nos despedimos timidamente, sem vontade de fazê-lo. Eu queria ficar junto pra sempre, mas quem disse que as coisas são fáceis pra mim??? Provavelmente o dia seguinte traria uma saudade doída, mas ainda assim feliz. Vão se ver de novo, os dois desconhecidos que tiveram um dia de sonho? Vai saber...

Entrei no táxi a caminho de casa sem certeza nenhuma, a não ser a de que, sempre que lembrar daquele domingo que começou cinzento e tornou-se ensolarado, meu coração irá sorrir. E, mesmo que chuvas e trovoadas sejam uma constante, ao refugiar-me naquelas horas passadas, o sol sempre estará brilhando intensamente. É brega, mas é assim que funcionam as coisas do amor...



|

2 Comments


Ah, Clênio,pode parecer 'brega' [e até falsidade, vamos concordar...] mas terminei o de lero post feliz por vc,por saber que pelo menos está diferente...espero que mais domingos ensolarados apareçam!

[]s


Que lindo! Nada brego... adorei! nossa, apaixonante... sem palavras, não queria que o texto teminasse.....

Copyright © 2009 Lennys' Mind All rights reserved. Theme by Laptop Geek. | Bloggerized by FalconHive. Distribuído por Templates