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EU MATEI A MINHA MÃE

Posted by Clenio on 17:58 in
Depois de assistir - e apreciar bastante - o canadense "Amores imaginários" fiquei tentado a conferir o primeiro trabalho de seu diretor-roteirista-produtor-ator, o extremamente jovem Xavier Dolan. Cheguei então à "Eu matei a minha mãe", lançado em 2009 e que foi ovacionado quando de sua exibição no Festival de Cannes. Ao contrário da maioria da crítica, porém, que incensou essa estreia e reclamou de alguns exageros estilísticos de seu segundo longa, é claramente perceptível o amadurecimento de Dolan entre um filme e outro. Enquanto "Eu matei a minha mãe" é um desabafo autobiográfico em altos brados contra a repressão familiar e as angústias da adolescência, "Amores imaginários" deixa de lado o tom agressivo para se concentrar na trágica poesia das paixões não-correspondidas. Talvez sejam dois lados da mesma moeda, mas uma coisa é certa: o guri tem talento e ainda vai longe.

Em "Eu matei a minha mãe" Dolan interpreta (??) Hubert Minel, um adolescente de 16 anos que vive uma relação de amor/ódio com sua mãe (Anne Dorval), que o criou sozinha desde que ele tinha meros sete anos de idade. Sentindo-se incompreendido por ela, o rapaz (que esconde dela até mesmo sua homossexualidade) encontra conforto em conversas com sua professora e se ressente de um relacionamento saudável familiar ao perceber a maneira leve e liberal com que seu namorado, Antonin (François Arnaud), tem com a sua própria mãe. Quando é matriculado - contra a vontade - em um colégio interno, a revolta de Hubert contra seu núcleo familiar (que inclui um pai ausente que serve para dar base às teorias de Freud) fica ainda mais patente e sua agressividade ainda maior.

Já em "Eu matei a minha mãe" nota-se algumas características que já fazem parte do estilo de Xavier, tais como closes frequentes de objetos e partes específicas do corpo, câmera lenta em profusão, uma trilha sonora descolada e boas ideias visuais. A verborragia típica do cinema francês (e no caso influência clara na obra do diretor) também dá o ar da graça e em alguns momentos chega a incomodar, ainda que faça parte do contexto dramático da trama, assim como as constantes referências à subcultura gay (Audrey Hepburn, James Dean) que são ainda mais explícitas do que em "Amores imaginários", ao contrário do que muito se falou. Neste primeiro filme de Dolan, a sexualidade do protagonista é um ponto ainda mais crucial (e apesar de não ser o ponto central do conflito mãe/filho, é parte preponderante da narrativa). E a complexidade das personagens é outro destaque do roteiro, que não se furta a fazer com que seu protagonista alterne momentos de desprezo extremo com uma ternura subjacente que grita por espaço. Dolan se sai bastante bem atuando como ele mesmo, e encontra em Anne Dorval um contraponto excepcional. São os momentos de calor entre eles (discussões aos berros ou carinho comovente) que movem o filme e o fazem realmente acontecer - assim como as confissões de Hubert à sua câmera digital, que dão ao espectador a real dimensão de seus sentimentos.

"Eu matei a minha mãe" já encontra-se a meio caminho para tornar-se um pequeno clássico dentro do universo independente/glbt/cult e tem qualidades suficientes para isso. Xavier Dolan também já demonstrou muito talento e garra. Resta apenas aguardar os próximos capítulos de uma carreira que tem tudo para ser longa e bem-sucedida.

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