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TESE SOBRE UM HOMICÍDIO

Posted by Clenio on 21:46 in
Que Ricardo Darin é um ator extraordinário todo mundo que assistiu a algum de seus filmes - "Nove rainhas", "O filho da noiva" e "O segredo dos seus olhos" estão entre os melhores - sabe. Também não é novidade que um filme estrelado por ele tem boas chances de chegar até os cinemas brasileiros e levar gente às salas de exibição só pela presença de seu nome no elenco. E, por incrível que pareça, Darin acerta muito mais do que erra (ao menos quando nos referimos ao que temos a oportunidade de conferir). O mais novo da leva é "Tese sobre um homicídio", um drama policial quase corriqueiro que tem em sua atuação o maior diferencial e foco de interesse.

Baseado em um romance de Diego Paszlowski, "Tese sobre um homicídio" não ousa nem em sua temática nem em seu desenvolvimento, preferindo uma narrativa linear para conquistar a plateia, mesmo que apresente um final capaz de dar um nó na cabeça do espectador. Como bom filme do gênero, apresenta sua trama, suas personagens e seus conflitos da maneira mais simples possível, para, a partir daí, envolver o público em um emaranhado de pistas falsas e um jogo psicológico interessante o bastante para prender a atenção do início ao fim.

Darin interpreta Roberto Bermudez, um especialista em direito criminal que passa a suspeitar que um de seus alunos, filho de um antigo conhecido, é o responsável pelo brutal assassinato de uma jovem mulher, cujo corpo foi jogado no estacionamento da faculdade. Desacreditado por todos à sua volta, ele acaba por investigar o crime por conta própria, sempre lutando contra o desejo de confrontar o jovem - que inicia um romance com a irmã da vítima.

"Tese sobre um homicídio" é um filme policial acima da média, com uma trama inteligente e um elenco capaz de dar credibilidade até mesmo a momentos que não fogem do clichê. Em uma temporada tão carente de boas opções no gênero não deixa de ser uma excelente pedida.

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A CAÇA

Posted by Clenio on 21:18 in
Fãs de um cinema mais denso, com ambições mais profundas do que simplesmente entreter já conhecem Thomas Vinterberg. Dinamarquês nascido em 1969, ele foi um dos criadores do malfadado Dogma 95 - que, nos anos 90 tentou mudar a forma de se fazer cinema, com uma sucessão de regras que aboliam artifícios externos na narrativa, como trilha sonora. Fez enorme sucesso entre os intelectuais com "Festa de família", mas depois seu trabalho ficou restrito a festivais e mostras internacionais. Com "A caça", seu novo filme - que deu a Mads Mikkelsen o prêmio de melhor ator no festival de Cannes de 2012 - ele demonstra que seu êxito na polêmica obra de 1998 não foi mero golpe de sorte. Forte e angustiante, seu novo trabalho já merece crédito por quebrar o velho paradigma que diz que as crianças são sempre sinceras.

A criança de "A caça" - uma menina de aparência angelical e modos delicados - não apenas mente como sua mentira destroi a vida de um homem inocente, a quem ela prejudica (talvez sem ter a plena consciência das possíveis consequências de seu ato, mas ainda assim de maneira irresponsável) quando o acusa de abuso sexual. Solitário e discreto, o professor Lucas (vivido por Mikkelsen, agora conhecido por sua interpretação como o psiquiatra canibal da série "Hannibal") tem sua vida abalada quando uma aluna, filha de um amigo seu, o denuncia para a diretora da escola. Transtornado pela acusação, Lucas imediatamente se vê privado da confiança dos colegas, sem trabalho e com a suspeita de tal ato sobre sua cabeça. Tratado com violência pelos conterrâneos e humilhado publicamente, a ele resta apenas o carinho do filho único e sua consciência limpa.

A intenção de Vinterberg - também um dos atores do roteiro - não é esmiuçar as investigações a respeito da denúncia infantil, nem tampouco fornecer à plateia um estudo voyeurista da decadência de um homem comum que tem seu mundo chacoalhado por uma mentira contada por alguém aparentemente incapaz de faltar com a verdade. O que "A caça" apresenta é o desenho melancólico de um homem que tem tirado de si a dignidade, a confiança e o respeito. Para isso, conta com uma atuação fantástica de Mads Mikkelsen, que faz de seu Lucas a encarnação perfeita de alguém cuja perplexidade impede de tomar quaisquer atitudes. E é justamente essa quase apatia do protagonista que talvez seja o calcanhar de Aquiles da obra de Vinterberg: o público assiste, atônito, um cidadão ser acusado, achincalhado, humilhado e agredido por algo que não cometeu e permanecer quieto, quase como uma personagem bíblica, disposta a oferecer a outra face. Esse sofrimento - que rivaliza com os calvários das personagens femininas de Lars Von Trier, colega de Vinterberg no Dogma 95 - encontra eco no roteiro coeso e no elenco coadjuvante, que dá suporte ao trabalho impecável de seu protagonista.

"A caça" é uma mostra definitiva do talento de Vinterberg e de sua inteligência em jamais deixar que um tema tão forte e denso como o tratado em seu filme descambe para o sensacionalismo barato. É cinema em estado bruto.



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HOMEM DE AÇO

Posted by Clenio on 21:01 in
Em 2006, quando Bryan Singer lançou "Superman, o retorno" não faltou quem reclamasse de cada escolha do cineasta (responsável pelo sucesso enorme dos dois primeiros capítulos de "X-Men"). Reclamações procedentes - como a escolha da insossa Kate Bosworth como Lois Lane - e improcedentes - como a opção por não fazer um reboot, como era moeda corrente entre as adaptações de quadrinhos para o cinema - acabaram se tornando verdades absolutas quando a bilheteria do filme não atingiu as expectativas da Warner. A ideia de uma franquia imediatamente foi arquivada e dedos foram apontados para Singer, para os roteiristas e até para Brandon Routh - que viu sua carreira definhar depois de interpretar um dos ícones mais absolutos da arte pop do século XX. É difícil de acreditar, portanto, que muitos dos detratores da obra de Singer tenham ficado satisfeitos com "O Homem de Aço", que Zack Snyder - do criativo "300" e do interessante porém cansativo "Watchmen, o filme" - assina, tentando mais uma vez dar início a uma série com a personagem. Misturando um visual "Matrix reloaded" com destruições exageradas ao pior estilo "Transformers", a nova aventura do Superman tem muito mais erros do que acertos - e dessa vez não tem Brandon Routh para carregar nas costas seus pecados.

Ignorando completamente a obra de Singer, o roteiro de "Homem de aço" - cuja estória é assinada por Christopher Nolan, que não demonstra aqui a mesma segurança e seriedade que imprimiu à trilogia do Homem-morcego - utiliza elementos do segundo filme estrelado por Christopher Reeve em 1980 para tentar reconquistar o público perdido. O roteiro não ignora as origens do heroi, mostrando seu nascimento em um planeta Krypton à beira da hecatombe - e com um visual exagerado - e o início da revolta de Zod (Michael Shannon tentando dar dignidade a um vilão mal-escrito). Depois do prólogo longuíssimo - que é mais tarde narrado em sua totalidade por Jor-El (Russell Crowe) a seu filho, em uma prova da prolixidade da trama - o filme dá um salto e mostra como o bebê salvo por seu pai  e adotado por um casal de fazendeiros interpretados por Kevin Costner e Diane Lane aprendeu a lidar com seus super-poderes. Sua vida - tão normal quanto possível sendo ele tão diferente de todas as pessoas que o rodeiam - sofre uma reviravolta quando o próprio Zod chega à Terra, disposto a aniquilar o planeta.

A trama de "Homem de aço" não foge aos lugares-comuns dos filmes de super-herois a que o público vem se acostumando há alguns anos e não é seu principal defeito. Apesar de estar longe da qualidade do roteiro das trilogias de Batman e X-Men (que se preocupava com as personagens tanto quanto com as cenas de ação), o filme de Snyder esbarra principalmente em seu desespero em cumular a plateia com sequências de destruição e uma violência que não choca nem empolga. Sua excessiva e desnecessária duração também atrapalha sua ambição a tornar-se lembrado com mais respeito do que seu antecessor: duas horas e meia sem uma história pra contar é demais até para o mais fiel fã, que chega a seu terço final testemunhando apenas cenas cansativas que remetem aos piores momentos de "Transformers" - e que anulam as boas ideias que surgiram no decorrer do caminho, como intercalar à ação presente alguns flashbacks que mostram a trajetória de Clark Kent rumo às pazes com sua origem.

É uma pena que um cineasta tão criativo quanto Zack Snyder tenha perdido a oportunidade de fazer de "Homem de aço" um filmaço, capaz de rivalizar com o que Christopher Nolan fez em sua trilogia com Christian Bale. Seu filme é chato, derivativo e cansativo. Dessa vez o exagero só atrapalhou.


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O GRANDE GATSBY

Posted by Clenio on 20:33 in
Quem conhece o cinema do australiano Baz Luhrmann sabe exatamente o que esperar de sua adaptação do clássico americano "O grande Gatsby", de F. Scott Fitzgerald. Deixando de lado a suntuosidade discreta e fleumática da versão de Jack Clayton, lançada em 1974 e estrelada por Robert Redford e Mia Farrow - e vencedora do Oscar de figurino - o homem que deu ao mundo obras que são um louvor incontestável ao kitsch, como "Vem dançar comigo" e "Moulin Rouge", reitera seu ponto de vista estético ao compor uma sinfonia de cores e opulência que, ao contrário do que se poderia esperar, casa-se perfeitamente com a história do romance de Fitzgerald. Se o filme de Clayton é considerado quase unanimemente chato pela crítica e pelo público por seguir fielmente o livro, a obra de Luhrmann irradia luz, calor e paixão na medida certa - ainda que, como sempre acontece com seus trabalhos, carregue nas tintas em seu começo, para somente depois envolver a plateia na história.

Tendo em vista seu currículo - onde o luxo e a efervescência cultural são ingredientes indispensáveis - é quase impossível pensar em outro diretor mais capaz do que Luhrmann de traduzir em imagens as palavras clássicas do homem que é também o criador do inesquecível Benjamin Button. Fotografada com precisão pelo neozelandês Simon Duggan, a recriação da Long Island dos anos 20 é perfeita em sua concepção: a ideia do diretor e de seus fieis colaboradores (entre eles a sua mulher, Catherine Martin, responsável pelo desenho de produção e pelos figurinos) não é ser fiel à realidade, e sim, às memórias de quem narra a estória, no caso, o escritor Nick Carraway (vivido com a habitual falta de entusiasmo por Tobey Maguire). Com sua visão de literato, Carraway não deixa de misturar ao real uma pitada bastante grande de poesia e ludicidade. Os olhos da audiência são os olhos de Carraway, e essa liberdade de ponto de vista é que transforma "O grande Gatbsy" via Luhrmann em, mais do que uma história de amor, um espetáculo de forma, cor e o sempre bem-vindo anacronismo musical que faz a delícia de seus fãs.

Se em "Moulin Rouge" o cineasta contou uma história passada no final do século XIX utilizando como trilha sonora nomes tão aparentemente incongruentes como Madonna, Nirvana, Paul McCartney e David Bowie, dessa vez ele conta com Beyoncé, Lana Del Rey e Florence Welch como moldura para suas insanidades visuais. Porém, aqui a música não é o prato principal, e sim um acompanhamento de luxo a uma trama de amor desesperado, contada com a sensibilidade e o ritmo do século XXI. Para tal, Luhrmann volta a contar com Leonardo DiCaprio, a quem ajudou a transformar em ídolo adolescente em 1996, com sua versão psicodélica de "Romeu e Julieta". DiCaprio - ainda tentando livrar-se da eterna imagem juvenil - vive a personagem-título, Jay Gatsby, um milionário conhecido por oferecer festas gigantescas em sua mansão em Long Island e que desperta a curiosidade de seu jovem vizinho, um aspirante a escritor que se vê envolvido no mundo alucinante e festivo dos anos 20. Não demora muito, porém,  para que as razões que levam Gatsby a ser o anfitrião mais conhecido das redondezas sejam conhecidas: apaixonado por uma antiga namorada, ele vê nessa vida de pompa e circunstância a oportunidade de reencontrá-la. O escritor não demora também a descobrir que tal namorada é sua prima, a bela Daisy Buchanam (Carey Mulligan), casada com o infiel e pouco dado a delicadezas Tom (Joel Edgerton). O triângulo amoroso, potencializado pelo caráter violento de Tom e pela impossibilidade de Daisy em abdicar de sua vida familiar, acaba banhando o belo litoral em sangue e lágrimas (sempre iluminados com um capricho arrebatador).

Se Leonardo DiCaprio não consegue fazer de seu Jay Gatsby uma figura potente e carismática a ponto de justificar o título do filme - chegando a ser irritante em alguns importantes momentos - e Tobey Maguire nunca ultrapassa o seu nível tradicional de interpretação, é inegável que Baz Luhrmann tem em mãos dois trunfos absolutos em termos dramáticos: Carey Mulligan e Joel Edgerton. O ator - que esteve em filmes elogiados como "Reino animal" e "Guerreiro", mas ainda não teve o devido reconhecimento - encontra o tom perfeito para seu Buchanan, roubando todas as cenas em que aparece. E Mulligan - que dispensa maiores comentários - cria uma Daisy etérea, delicada e frágil na medida certa, valorizada pelo figurino impecável e por seu talento imenso. Se o visual acachapante criado por Luhrmann é o corpo de "O grande Gatsby", Carey é sua alma.

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