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12 ANOS DE ESCRAVIDÃO

Posted by Clenio on 20:11 in
A curta filmografia em longa-metragem do cineasta Steve McQueen - até então restrita a dois nomes, os poderosos "Hunger" e "Shame" - ganha um importante terceiro capítulo com "12 anos de escravidão", que se utiliza de seu requintado senso estético para contar uma trama pungente e cruel sobre um dos períodos mais nefastos da história da humanidade. Baseado em um história real, seu novo trabalho - que já ganhou o Golden Globe de melhor drama e deve ser um dos favoritos ao próximo Oscar- tem um apelo mais universal do que os anteriores, mas, assim como eles, prescinde dos clichês ao evitar o sentimentalismo fácil, armadilha na qual os filmes sobre o tema frequentemente caem. Se a intenção do espectador é emocionar-se com longas sequências de maus-tratos ao som de um música grandiloquente e discursos empolados sobre liberdade, o filme não é este. "12 anos de escravidão" é forte, sim, mas sua força reside justamente em seu distanciamento milimetricamente calculado para emocionar sem pieguice.

O roteiro repleto de elipses - o que tanto ajuda na agilidade quanto atrapalha na compreensão de alguns fatos para quem está acostumado à maneira quase didática com que Hollywood normalmente trata seu público - talvez seja o primeiro fator de estranhamento do filme de McQueen."12 anos de escravidão" já começa sem explicar muito, deixando a audiência tão atônita quanto o protagonista, que se vê, sem entender muito o que está se passando, como um escravo, muito tempo depois de já ter sido liberto e ter uma vida como um homem comum nos EUA pré-Guerra Civil. É aos poucos que a trama começa a ser explicada, e mesmo assim, não de maneira linear. O roteirista John Ridley parece ter compreendido exatamente o estilo do cineasta, preferindo mostrar a luta do protagonista pela reconquista da liberdade mais através de imagens poderosas do que por diálogos - não chega a ser nervosamente silencioso como seus filmes anteriores, mas aposta acertadamente nas sensações em detrimento da manipulação sentimental.

E é a opção de Steve McQueen em fugir da manipulação o grande diferencial de seu filme. Por ser negro - e consequentemente ter uma ligação bastante emocional com o tema da obra - seria previsível que McQueen se deixasse levar pela tendência a enfatizar o lado físicamente cruel da narrativa, forçando o espectador a emocionar-se com uma música redundante e interpretações exageradas. Seguindo o caminho oposto, ele prefere documentar a história sem subterfúgios outros que não o absurdo da situação, acreditando - acertadamente - que não é necessário aumentar o que já é sofrido o suficiente. A tática dá certo? Sim e não. Sim porque oferece mais ao público do que o esperado em termos de qualidade narrativa. Não porque talvez esse mesmo público - mal-acostumado que está - tivesse em mente mais um espetáculo de sadismo do que um libelo delicado à liberdade.

E não dá para falar de "12 anos de escravidão" - e louvar suas inúmeras qualidades - sem mencionar o elenco excepcional escalado por Steve McQueen. Chiwetel Ejiofor, até então um ator relegado a papéis coadjuvantes em filmes grandes ("Simplesmente amor" e "2012") ou papéis importantes em filmes bons pouco vistos ("Coisas belas e sujas") entrega uma performance silenciosa e expressiva no papel de Solomon Northup, um homem determinado a encarar seu destino sem deixar-se perder a dignidade de ser humano - mesmo diante de atrocidades e golpes baixos. A estreante Lupita Nyong'o dá um show como a desesperada Patsey, objeto de desejo de seu senhor - e por isso mesmo alvo da ira de sua senhora - em pelo menos uma grande cena. E, se o elenco masculino conta ainda com bons momentos de Paul Dano e a presença do produtor Brad Pitt, é novamente Michael Fassbender (em seu terceiro trabalho com o diretor) quem rouba todas as cenas em que aparece. Como o cruel Edwin Epps, o ator alemão comprova seu imenso talento em um personagem a anos-luz de distância de seu militante de "Hunger" ou o viciado em sexo de "Shame". Basta que apareça em cena para que Fassbender convença a audiência de sua maldade inerente. Não é pouca coisa.

No final das contas, "12 anos de escravidão" é um grande filme, contado com elegância e emoção nas medidas certas e que tem a ousadia de manter o estilo de seu diretor mesmo que ele não seja o que a grande massa espera. Vai fazer história, independente de ser premiado com o Oscar ou não.

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1 Comments


Continuo não gostando do recorte. Acho exagerado sim, a sutileza daquela crueldade aparece em poucos momentos, como nas esposas dos fazendeiros. De resto, um show de horror, desnecessário. Todos sabemos os horrores daquele tempo e o filme não sai do lugar comum. A luta interna do protagonista bem como sua luta com as cortes americanas foram vaporizadas do filme, virou resumo de fim de filme baseado em fatos reais. Uma pena mesmo.

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