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EU, MAMÃE E OS MENINOS

Posted by Clenio on 23:45 in
A busca pela identidade sexual na infância ainda é um assunto relativamente pouco explorado pelo cinema - apesar de títulos interessantes como o belga "Minha vida em cor-de-rosa" e o recente "Tomboy" - talvez por ser um tema delicado e um tanto polêmico. Por isso não deixa de ser louvável que um filme como "Eu, mamãe e os meninos" tenha saído da última edição do César - o Oscar francês - com cinco estatuetas, incluindo os cobiçados prêmios de melhor roteiro adaptado, ator e filme. Adaptado por Guillaume Galliene de sua própria peça teatral - por sua vez inspirada na excêntrica relação que tinha com a mãe - a comédia dramática pode até lembrar o nacional "Minha mãe é uma peça", mas tem ambições muito maiores do que o filme estrelado por Paulo Gustavo. Enquanto o brasileiro campeão de bilheteria tinha como objetivo básico arrancar gargalhadas da audiência, Galliene (egresso da afamada Comèdie Française) mira mais alto: ao analisar as dúvidas sexuais de seu protagonista, ele faz rir sem jamais deixar de criticar, nas entrelinhas, a necessidade quase patológica do ser humano em impor rótulos e limitações. Se por um lado atinge seu objetivo - com um final que tanto pode surpreender quanto decepcionar - por outro tropeça, em alguns momentos, em um humor um tanto questionável.

Utilizando-se de uma estrutura pouco usual - que mistura organicamente a linguagem teatral com a cinematográfica sem maior prejuízo de nenhuma delas - "Eu, mamãe e os meninos" acompanha a trajetória do próprio Guillaume, que desde a infãncia sentia-se diferente dos dois irmãos: pouco afeito a esportes e ligado às raias da obsessão à sua mãe, o garoto passava os dias trancado em seu quarto, vestindo-se da imperatriz austríaca Sissi e tentando imitar os trejeitos da mãe e das tias. Seus modos - que logicamente não agradam ao pai e despertam o riso do resto da família - acabam o levando a experiências das mais variadas, sempre na tentativa de dar nome à sua diferença. Tais experiências - tão díspares como um colégio interno, terapeutas e uma boate gay - acabam servindo para que Guillaume perceba que encontrar a si mesmo independe dos outros e que somente ele pode descobrir quem ele realmente é.

A maior das qualidades de "Eu, mamãe e os meninos" - à parte a coragem do diretor/roteirista/ator em fugir dos padrões convencionais de contar uma história que poderia facilmente tornar-se mais uma comédia francesa com destino a cult - é a interpretação do próprio Guillaume Galliene, merecidamente premiado por sua atuação. Vivendo ele mesmo em diversas fases de sua vida - desde a infância até a fase adulta - e interpretando também sua mãe (mais uma semelhança com o trabalho de Paulo Gustavo), ele conduz o público a uma viagem frequentemente constrangedora (no bom sentido) pelas dúvidas de uma criança/adolescente que, consciente de suas diferenças, procura encaixar-se em um mundo normalmente avesso a elas. Tendo coragem em finalizar sua odisseia de forma inesperada - que é um tapa na cara dos adeptos do sectarismo mas de certa forma nega quase tudo que foi mostrado antes - Galliene oferece ao espectador momentos de um humor sutil, capaz de agradar mesmo aos mais exigentes. E só o fato de despertar discussões com seu desfecho já é digno de nota.

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REFÉM DA PAIXÃO

Posted by Clenio on 23:44 in
Basta dar uma olhada na lista de filmes com a assinatura de Jason Reitman para perceber que o jovem (37 anos) cineasta não é exatamente um romântico ou um entusiasta da raça humana, voltando sua câmera sempre para personagens munidos de alta dose de cinismo e/ou desprezo pelo próximo. Assim era o lobista da indústria tabagista vivido por Aaron Eckhart em "Obrigado por fumar" (2005), a adolescente pragmática que se descobria grávida em "Juno" (2007), o solitário executivo que George Clooney interpretou em "Amor sem escalas" (2009) e a escritora bem-sucedida que resolvia reconquistar um antigo amor em "Jovens adultos" (2011). Sendo assim, não deixa de ser uma surpresa que seja seu nome que esteja por trás de "Refém da paixão", uma história de amor na mais tradicional acepção do termo - e seu carinho pelos personagens não deixa dúvidas sobre seu talento em tornar interessantes pessoas aparentemente normais.

Baseado em um livro de Joyce Maynard, "Refém da paixão" - mais um da série "títulos nacionais horrendos para filmes bons" - não apresenta grandes novidades a seu gênero, preferindo manter uma linha narrativa simples, opção que, ao mesmo tempo em que perigosamente se desvia de uma maior criatividade, o aproxima mais facilmente do espectador que procura apenas uma história bem contada. E, a despeito da falta de novidades da trama e da direção correta mas nunca brilhante de Reitman, o filme é exatamente isso: uma história de amor envolvente, delicada e que tem seus maiores trunfos atendendo pelos nomes de Josh Brolin e Kate Winslet.

Winslet, em um papel que lhe rendeu uma indicação ao último Golden Globe, interpreta Adele, uma mulher incapaz de reagir à separação do marido - que a deixou por outra - e que vive quase reclusa, tendo por companhia apenas o filho pré-adolescente, Henry (o ótimo Gattlin Griffith). Sua inconstância preocupa o menino, que, por sua vez, tenta levar a vida da forma mais normal possível. A pacata rotina de mãe e filho, porém, é abalada às vésperas do feriado do Dia do Trabalho, quando uma aparentemente inocente carona os põe diante de Frank (Brolin, em mais um trabalho digno de nota), um homem condenado por homicídio que, ferido em sua fuga do presídio, os mantém prisioneiros dentro de casa. O que poderia ser uma experiência traumática, porém, é amenizada pela relação que se estabelece entre algoz e reféns: prestativo e gentil, Frank aos poucos conquista a confiança de Henry - que vê nele a figura paterna que frequentemente lhe falta - e o amor de Adele, que se apaixona por ele e passa a considerar uma mudança radical em sua vida.

Ainda que vez ou outra lembre "Um mundo perfeito" - subestimado filme de Clint Eastwood estrelado por Kevin Costner nos anos 90 - "Refém da paixão" tem identidade própria. É inegável que muitas vezes escorregue em alguns clichês do gênero, mas suas qualidades de certa forma o absolvem de um julgamento mais duro. A química entre Winslet e Brolin - ator que os mais nostálgicos sempre verão como o irmão mais velho do oitentista "Os goonies", mas que vem construindo uma brilhante carreira de 2007 pra cá - é palpável mesmo quando sua relação evolui de forma um tanto rápida demais e Griffith constrói um Henry na medida certa entre ingenuidade, coragem e sensibilidade - fato que nem a presença do sempre inexpressivo Tobey Maguire em sua versão adulta consegue atrapalhar.

"Refém da paixão" é quase um corpo estranho na filmografia de Jason Reitman, mas é, ao mesmo tempo, uma bem-vinda tentativa de aventurar-se em um gênero que precisa desesperadamente de um sopro de talento e sensibilidade. É um belo drama romântico, realizado com inteligência e um tom nostálgico que lhe serve como uma luva. Ainda não foi dessa vez que Reitman decepcionou.

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