2

UM FILME INFANTOJUVENIL E AS VERDADES SOBRE O AMOR

Posted by Clenio on 15:10 in
O filme é bobinho, mesmo porque é infantojuvenil. O elenco tem aqueles atores que conhecemos de vista mas não sabemos o nome (mentira, sei, sim... Cynthia Nixon, de "Sex and the city" e Bradley Withford, que foi irmão de Tom Hanks em "Filadélfia"). O cenário é aquela Nova York com a qual todos os românticos sonham (sem problema de espécie alguma). E os protagonistas da história de amor são um menino de dez anos cujos pais estão se divorciando (vivido por Josh Hutcherson, roubando descaradamente o filme com seu carisma infantil) e sua colega de caratê, poucos meses mais velha (mas mais madura, conforme ela mesma afirma) e em vias de mudar de escola. Então por que "ABC do amor" - tradução idiota de "Little Manhattan" - me conquistou tanto? Simples. É porque, através do ponto de vista de uma criança inexperiente e vivendo seu primeiro amor, eu pude finalmente entender o porquê de tanta gente insistir em se apaixonar várias e várias vezes mesmo sabendo que o amor pode trazer tanto sofrimento (ou LEMBRAR o porquê): todos buscam aquele sentimento estranho de borboletas no estômago porque, apesar de estranho... ele é uma delícia.

Apesar de ser uma criança, Gabe - o protagonista do filme - não deixa de ser um alter-ego de todos aqueles que acreditam no amor, na paixão desmedida, no desespero sem fim, na angústia dos olhares enigmáticos, no medo de ter se precipitado, nas palavras ditas de forma errada, no medo de não ser correspondido, na tristeza de saber que tudo pode estar apenas dentro de sua cabeça. Na sua inocente paixão por Rosemary Telesco (vivida com graça por Charlie Ray), Gabe constrói um mundo de dúvidas que qualquer adulto compreenderia. Que atire a primeira pedra quem nunca imaginou uma vida inteira ao lado da pessoa amada (mesmo que a conheça há poucos minutos). Que julgue quem nunca se sentiu a pessoa mais poderosa do universo ao sentir o toque de quem ama. Que olhe com desprezo quem nunca sentiu o coração disparar quando o telefone toca... Gabe passa por tudo isso com a beleza de uma primeira vez e é justamente aí que o filme atinge seu ponto principal.

Amar só vale a pena se for como da primeira vez. Amar sem aquele frio na barriga, sem a espera de um telefonema, sem a sensação de onipotência, sem aquela pontadinha de angústia masoquista, sem aqueles momentos de alegre tensão diante do primeiro beijo (e do segundo, e do terceiro) e sem aquela vontade de nunca mais ver o dia (ou a noite) acabar não tem graça. É preciso sempre que sejamos crianças quando nos apaixonamos. É preciso aquela entrega infantil, quase ingênua. É essencial que não tenhamos aquele cinismo de amores passados, que o esqueçamos como quem esquece a tabuada do oito justamente na hora da prova oral. Todo amor deve ser como o primeiro, como se fosse o último, como se fosse o realmente mais importante de toda a nossa vida. Pra amar de verdade - contrariando aí toda uma teoria que diz que amor verdadeiro é aquele maduro e etc etc - é preciso que amemos como um menino de dez anos apaixonado pela colega de caratê. O mundo adulto já é cruel o bastante para que até mesmo no amor as coisas pesem.

Obrigado, "ABC do amor". Por sua causa, eu voltei a acreditar que um dia vou amar de novo. E se não for como Gabe ama Rosemary Telesco não tem a menor graça.

|
1

SETE DIAS COM MARILYN

Posted by Clenio on 14:09 in
Às vésperas do aniversário de 50 anos de sua morte – em agosto de 1962 – nunca se falou tanto de Marilyn Monroe quanto atualmente. Diários, livros, séries de TV – o delicioso musical “Smash”, produzido por Steven Spielberg – e biogarfias pipocam o tempo todo, comprovando a perenidade do maior mito sexual já produzido por Hollywood. De todos os projetos envolvendo o nome da atriz, porém, o que melhor sintetiza sua personalidade problemática e um tanto infantil é o filme “Sete dias com Marilyn”, dirigido por Simon Curtis e baseado em um livro de memórias do produtor Colin Clark – na época apenas um jovem que sonhava em fazer parte do mundo do cinema. Merecidamenteelogiado pela crítica e pelo público, o filme tem muito mais acertos do que equívocos.

O primeiro acerto de Curtis foi o de optar não por uma biografia convencional (o que exigiria malabarismos inglórios de roteiro para concentrar em palatáveis 120 minutos uma vida curta mas bastante agitada), mas por concentrar-se em um período bastante específico da carreira da estrela – a saber, as tempestuosas filmagens de “O príncipe encantado”, onde ela atuou ao lado de ninguém menos que Sir Laurence Olivier, considerado então (e ainda hoje) um dos maiores atores shakespereanos de todos os tempos. Na ocasião mostrada no filme, Olivier tentava conquistar a plateia mais jovem de cinema – que já não o dava o devido valor comercial – trazendo para junto de si a sensual e popular Marilyn, à época recém-casada com o dramaturgo Arthur Miller. Sua ideia, que parecia brilhante a princípio, revela-se um tormento quando o experiente ator começa a sair do sério com os caprichos da atriz. Constantemente atrasada, sem capacidade aparente de decorar suas falas e com a absurda exigência de estar sempre acompanhada de sua assistente artística Paula Strassberg (mulher do famigerado Lee Strassber, criador do Actor’s Studio), Marilyn acabou sendo uma constante dor de cabeça a Olivier – que mesmo assim caiu de amores por ela, abalando seu casamento com Vivien Leigh.

O segundo acerto do diretor foi não tentar explicar ou desvendar a complexa personalidade de Monroe, até hoje cercada de teorias das mais variadas – para cada um que a julga uma moça ingênua e pura que foi envolvida pelo turbilhão da fama há outro que a considera uma prostituta de luxo sem talento nenhum a não ser dormir com os homens certos para conseguir fama. Por ser contado sob o ponto de vista de Clark – um jovem empregado de Olivier que acaba servindo de assistente pessoal de Marilyn em sua estada em Londres e que também se apaixona por ela – o filme se dedica exclusivamente a testemunhar os bastidores da filmagem, dando apenas pequenos vislumbres da intimidade de sua protagonista. E é nesses momentos que o filme cresce: ao invés de jogar luz na sombria alma de Monroe, Curtis apenas a contempla, registrando em celulóide a metamorfose de uma mulher carente e insegura em um furacão sensual que ditou as normas de várias gerações de símbolos sexuais.

E é justamente nessas metamorfoses sutis que brilha o maior acerto do filme: sua estrela, Michelle Williams. Simon Curtis acertou em cheio ao escolher Michelle – não particularmente bela ou mesmo parecida com Marilyn. Atriz oriunda da TV (onde estrelou a série teen “Dawson’s Creek” por anos), Williams vem se mostrando uma atriz de grande capacidade dramática, o que suas indicações ao Oscar por “O segredo de Brokeback Mountain” e o dolorido “Namorados para sempre” comprovam sem sombra de dúvida. Na pele de Marilyn ela desaparece completamente, entregando uma atuação sensível e reverente (e nunca exagerada). Seu minucioso trabalho de voz e corpo faz, inclusive, com que, em determinados ângulos, ela tenha uma assombrosa semelhança com Monroe (principalmente em suas cenas com Eddie Redmayne, que vive Colin Clark). Além disso, Michelle tem também a sorte de contar com companheiros de elenco dos mais desejáveis: Kenneth Branagh está absolutamente perfeito como Laurence Olivier (e é irônico que o ator irlandês também seja bastante conhecido por suas performances em obras de Shakespeare) e Judi Dench mais uma vez encanta a plateia com uma atuação caprichada na pele da atriz Sybill Thorndicke (que serviu de apoio à Marilyn em seus momentos de insegurança artística). O único senão da escalação de elenco é Julia Ormond, absolutamente deslocada no papel de Vivien Leigh (aliás, onde é que acharam que Ormond, com sua falta de charme e beleza, poderia viver a linda intérprete de Scarlett O’Hara? A opção anterior, Catherine Zeta-Jones, seria bem mais acertada).

“Sete dias com Marilyn” não é brilhante. Vez ou outra perde seu ritmo e peca por não dar a devida importância a alguns fatores importantes (como a crise em seu casamento com Miller, vivido aqui pelo ator Dougray Scott). Mas é extremamente interessante para fãs de cinema e é um filme que respeita sua memória sem que seja um pálido veículo de adoração. E vale também pela atuação sensível e delicada de Michelle Williams, vencedora, com justiça, do Golden Globe deste ano.

|
1

RAUL: O INÍCIO, O FIM E O MEIO

Posted by Clenio on 23:28 in
Não é preciso ser fã do rock indefinível criado por seu protagonista para se gostar de "Raul: o início, o fim e o meio", documentário de Walter Carvalho sobre um dos mais polêmicos astros da música brasileira, que escapava facilmente de qualquer rótulo que porventura o mercado quisesse lhe impor. Basta gostar de história da cultura popular nacional - ou de documentários inteligentes - para se deixar envolver. Ao contrário do filme anterior de Carvalho - um dos mais renomados diretores de fotografia do cinema nacional - que contava a vida do roqueiro Cazuza (em tom ficcional), esse seu novo trabalho é resultado de uma pesquisa que consumiu mais de dois anos de sua vida, além de entrevistas com mais de 90 pessoas que tiveram algum tipo de contato com Seixas. O resultado é um filme emocionante, engraçado, nostálgico e revelador, ainda que felizmente não tenha a intenção de "definir" seu personagem principal.

Inserido em uma tradição recente da cinematografia nacional - que vem trazendo à luz nomes esquecidos e/ou injustiçados do cancioneiro popular brasileiro, como "Loki" (sobre Arnaldo Baptista) e "Ninguém sabe o duro que eu dei" (genial trabalho sobre Wilson Simonal) - "Raul: o início, o fim e o meio" tem a seu favor o carisma de seu investigado, um artista cuja obra rica e surpreendente ainda hoje mantém-se viva graças a legiões de fãs apaixonados e à contemporaneidade de sua música, que se presta a inúmeras leituras. É impossível para qualquer brasileiro nunca ter escutado ou cantarolado Seixas, e essa espécie de "inconsciente coletivo" apenas ajuda o filme, que, através de depoimentos de gente que realmente tem o que contar sobre o artista, cria um mosaico tão vasto sobre sua personalidade que, ao término da sessão não apenas um Raul fica na mente do público e sim vários: tudo depende do olho do espectador.

Entremeadas às canções saudosas de Seixas - e não fica faltando nenhuma delas na seleção de Carvalho - existe depoimentos de todas as suas companheiras (e, com a exceção de sua primeira mulher, Edith, todas ainda mantém um perceptível carinho por ele), de seus amigos de infância, de suas filhas, de fãs, de colegas de trabalho e, como não poderia deixar de ser, de dois polêmicos parceiros: Paulo Coelho e Marcelo Nova. Enquanto o primeiro dá um longo depoimento sobre sua relação com Raul - e não tem medo aí de assumir que apresentou a eles todas as drogas possíveis, além de conduzí-lo ao estranho mundo da contracultura - o segundo tem que lidar com as acusações de alguns fãs e amigos do compositor de que foi o responsável por sua morte precoce (enquanto outras vozes, como Caetano Veloso, o defendem, acreditando em seu relacionamento de admiração genuína). Doente, Seixas morreu aos 44 anos - mas aparentando bem mais - depois de uma tourné de 50 shows com Nova (que o resgatou de um triste "chega pra lá" da indústria fonográfica).

Como filme, "Raul: o início, o fim e o meio" é o que se propõe a ser: um documento sobre um dos mais criativos e verdadeiros artistas pop do Brasil, que misturou Elvis Presley a Luiz Gonzaga sem jamais deixar de imprimir sua personalidade forte. E é inteligente ao optar por não chegar a nenhuma conclusão, o que seria no mínimo incoerente com a própria arte de Raul, que se intitulava uma "metamorfose ambulante". Seja como "carimbador maluco" (que o apresentou a uma nova geração de fãs, na qual me incluo), como "maluco beleza" ou como o criador de uma "sociedade alternativa", ele deixou sua marca indelével na cultura musical nacional. E não deixa de ser uma obrigação assistir à sua história. Ele é, definitivamente, a mosca que não para de pousar na nossa sopa (que o diga Paulo Coelho em uma cena destinada à antológica do filme). E nós não cansamos desse zunido...

|
1

HABEMUS PAPAM

Posted by Clenio on 00:10 in
O cineasta italiano Nani Moretti não deixa de ser um queridinho do Festival de Cannes, de onde saiu premiado e duas ocasiões, pelos filmes “Caro diário”(1993) e “O quarto do filho” (2001), que tinham em comum uma visão doce e romântica do dia-a-dia - e que não se deixavam levar pelo pessimismo mesmo quando tratavam de assuntos como câncer e a perda de um filho. Sua nova obra, a comédia "Habemus Papam"  não teve a mesma sorte do que os filmes anteriores do diretor, mas mantém seu frescor e sua sensibilidade, dessa vez com um enfoque mais bem-humorado - até mesmo por tratar-se de uma comédia. Mas, ao contrário de seu conterrâneo Roberto Benigni, que usa e abusa do humor visual para garantir gargalhadas, Moretti prefere fazer humor por um caminho menos fácil e mais inteligente: o da ironia.

Seu filme começa mostrando os bastidores de um dos processos eleitorais mais secretos do mundo: a escolha de um novo Papa. Enquanto o planeta inteiro espera, em suspenso, pelo nome do novo Sumo Sacredote da Igreja Católica, os candidatos ao posto (e até mesmo aqueles que não o desejam de jeito nenhum) votam, conscientes da importância de seu ato. Papa escolhido, a questão passa a ser outra, bem menos corriqueira: o eleito para conduzir os cristãos do mundo (vivido com delicadeza e graça por Michel Piccoli) simplesmente entra em crise existencial e não consegue fazer o discurso de agardecimento aos fiéis. Sentindo que o problema pode aumentar ainda mais, os demais religiosos resolvem então chamar um psicanalista (o próprio Moretti) para solucionar a questão. A situação se complica quando o novo Papa simplesmente foge do Vaticano para repensar sua vocação.

Apesar da premissa inicial lembrar de leve o superestimado "O discurso do rei", o filme de Moretti se sai muito melhor do que o filme vencedor do Oscar. Em primeiro lugar, seu humor é bem mais fino e menos clichê. Em segundo lugar, a relação entre o Papa e o analista logo é substituída pelo foco nas aventuras do religioso pela cidade, tentando recobrar seu passado e pela forma com que o médico convence os cardeais a passarem o tempo (e não deixa de ser engraçadamente terno ver homens de meia-idade, vestidos de padre, jogando vôlei no pátio do Vaticano). Utilizando-se de diálogos verdadeiramente divertidos (principalmente quando faz troça da psicanálise e da própria religião católica sem ofender a nenhuma das classes) e de atores em dias inspirados, o cineasta conduz o espectador por um caminho repleto de belas surpresas e bom-humor, até culminar com um final coerente e verossímel.

"Habemus Papam" faz rir, faz pensar e pode até mesmo emocionar ao espectador mais sensível. E é também a prova de que Nani Moretti é um dos cineastas italianos mais importantes de seu tempo.



|
2

JOVENS ADULTOS

Posted by Clenio on 19:56 in
A expectativa era das maiores. Depois que a comédia "Juno" - que era legalzinha, mas só isso - virou mania entre o público hype de cinema, o reencontro entre o diretor Jason Reitman e a roteirista Diablo Cody era esperado ansiosamente pelos fãs. Porém, quando o novo filho do casal chegou às telas americanas, no final do ano passado, uma desagradável surpresa aconteceu: com uma bilheteria ínfima de pouco mais de 16 milhões de dólares arrecadados, "Jovens adultos" não atingiu seu objetivo de arrebatar estatuetas douradas (apenas uma única indicação solitária ao Golden Globe) e morreu na praia, sem fazer muito barulho. O problema desse silêncio em torno do filme de Reitman, no entanto, é que ele esconde um tesouro. Dono de um humor com sabor de ressaca moral, "Jovens adultos" é um dos mais inteligentes filmes do ano passado e é bastante superior às aventuras da adolescente grávida e articulada do trabalho anterior da dupla de criadores. E ainda por cima dá à Charlize Theron a melhor oportunidade de brilhar como atriz desde seu Oscar por "Monster", de 2003.

A personagem de Theron é Mavis Grady, escritora de literatura juvenil cuja série de livros está em vias de terminar. Porém, sob a máscara de uma profissional bem-sucedida (que desde a adolescência sempre foi a mais popular e desejada) existe uma mulher divorciada, a caminho dos quarenta anos, alcóolatra e solitária. Sua crise existencial aumenta consideravelmente quando ela recebe, por email, a notícia que seu ex-namorado Buddy (Patrick Wilson) acaba de ser pai. Certa de que seu antigo romance foi interrompido indevidamente e que ainda existe paixão entre eles, ela faz as malas, põe seu cachorro debaixo do braço e parte imediatamente para a cidade do interior de onde saiu para tentar a sorte. Seu objetivo: reconquistar o homem que ama. Seu maior obstáculo: a família que ele está começando a criar. Seu maior aliado/conselheiro/grilo falante: Matt Freehauf (Patton Oswalt), um antigo colega de classe que tem um passado traumático e vive de muletas, cuidando de sua coleção de bonecos de plástico.

O roteiro de "Jovens adultos" é repleto de piadas secas, tristes, amargas. O clima imposto por Jason Reitman é de desilusão, de apatia, de solidão extrema. Mavis Grady, mais que uma anti-heroína, é um ser perdido em suas incongruências e sua busca por algo que nem mesmo ela sabe o que é. Seu caminho em direção ao passado é uma forma de consertar o que não tem conserto, de dar à sua vida (banal, vazia, melancólica) o final feliz que proporciona a suas personagens adolescentes (cujos dramas ela rouba das pessoas à sua volta). O que ela vê em Buddy não é O AMOR: é a chance de reviver, de reinventar-se mais uma vez, de tentar preencher o buraco de sua própria alma. E quando essa consciência finalmente vem à tona é que o trabalho de Theron mostra-se ainda mais corajoso e sensível. Desprovida de qualquer glamour (ainda que mesmo assim seja extremamente linda), ela entrega ao público uma atuação verdadeira, honesta, transparente. Seus diálogos com Patton Oswalt (uma revelação) são, ao mesmo tempo, de partir o coração e radicalmente engraçados, ilustrando o encontro de duas pessoas diante da brutal constatação de que a vida é o que ela é: violenta e sádica.

Não espere de "Jovens adultos" uma típica comédia para passar o tempo. Cínica e dolorosamente próxima da vida real (ao menos dos sentimentos reais), é um passo à frente nas carreiras de Cody e Reitman. Não desperta gargalhadas, e sim uma certa tristeza. E não é da dor que surgem as melhores piadas?

|
0

A DANÇARINA E O LADRÃO

Posted by Clenio on 03:36 in
Já virou lugar-comum dizer o quanto o argentino Ricardo Darín é um dos maiores atores em atividade no momento, aumentando inclusive o interesse por filmes que, não fosse sua presença sempre marcante, poderiam passar em brancas nuvens. Mas não há como negar que, mais uma vez é seu trabalho sempre acima da média que faz com que o drama "A dançarina e o ladrão" - realizado em 2009 mas que só agora chega às telas - se torne mais uma bela experiência cinematográfica ainda que esteja longe de ser uma obra-prima. Dessa vez, porém, Darín nem vive é o centro absoluto da trama, dividindo generosamente a protagonização com o jovem Abel Ayala.

Baseado em um romance de Antonio Skarmeta - autor de "O carteiro e o poeta" - chamado "O baile da vitória", "A dançarina e o ladrão" é dirigido por Fernando Trueba, vencedor do Oscar de filme estrangeiro de 92 pelo belo "Sedução". Dessa vez o cineasta centra sua história em Santiago do Chile no momento de sua redemocratização pós-Pinochet. Quando o filme começa, o famoso ladrão de cofres Nicolás Vergara Grey (vivido por Darín) sai da cadeia, beneficiado com um programa de anistia do governo. Sua primeira ação é procurar a ex-mulher e o filho pequeno, já absortos em uma nova família com outro homem. Falido e preocupado em dar uma vida confortável ao herdeiro, Nicolás acaba aceitando, depois de muito recusar, participar de um golpe que pode lhe dar dinheiro o bastante para resolver sua vida. Quem o convence a roubar o dinheiro sujo que pertence a um dos generais do ex-ditador é Angel Santíago (o ótimo Ayala), que também acaba de sair da cadeia e tenciona usar o dinheiro para casar-se com Victoria (Miranda Bodenhofer), uma talentosa bailarina criada por uma professora de dança pobre mas dedicada (interpretada pela brasileira Márcia Haydée). Victoria não fala desde que presenciou a morte dos pais pelas mãos dos militares, mas vê em Angel (com o perdão do trocadilho) o anjo que a protegerá da dureza da vida e lhe proporcionará o amor de que necessita. O que nenhum deles sabe é que o rapaz está marcado para morrer, condenado pelo erro do passado.

Muito criticou-se o filme de Trueba, acusando-o de apelar para os mais variados clichês com a intenção de cativar a audiência. O que pouca gente talvez tenha percebido é que seu carinho pelas personagens é maior do que qualquer tropeço de roteiro ou direção. Mesmo que todos os elementos que o filme apresenta já tenham sido visto em outros trabalhos - o roubo perfeito, a jovem desacreditada que comove a todos com seu talento, o homem tentando reencontrar o afeto do filho - eles surgem aqui revestidos com delicadeza e respeito. A personagem de Ayala, por exemplo, é carismática ao extremo, dona de uma inocência quase pueril mesmo quando rouba de caixas eletrônicos ou aponta uma arma para a diretora do Teatro Municipal de Santiago para exigir uma chance para a mulher que ama. É difícil não gostar de Angel e não torcer por ele, mesmo que o roteiro jogue um pouco sujo para que isso aconteça, colocando-o como um amante quixotesco que implora pela simpatia do público com seu sorriso fácil e sua passionalidade. Um detalhe totalmente perdoável diante do resultado final: um filme simpático e delicado que nem de longe merece o pouco-caso com que foi recebido por muita gente.

|
0

HELENO

Posted by Clenio on 21:33 in
Esqueçam Adriano, Ronaldo Fenômeno e todos os jogadores de futebol que muitas vezes tem suas vidas pessoais regadas a escândalos chamando mais a atenção do que seus dotes esportivos: quem começou essa febre - e nos longínquos anos 40 - foi um jogador bonito, letrado (formado em Direito) e talentoso chamado Heleno de Freitas. Ídolo da torcida botafoguense, o charmoso don juan acabou seus míseros 39 anos destruído pela sífilis, depois de ter acabado com sua carreira graças a seu temperamento esquentado e sua paixão por mulheres, cigarros e éter. E é essa personagem trágica que Luiz Henrique Fonseca elegeu como protagonista de seu segundo longa, "Heleno" (quase uma década depois de seu"O homem do ano"). Estrelado por um Rodrigo Santoro lembrando ao público porque chamou a atenção dos produtores hollywoodianos, o novo filme de Fonseca é dolorido e triste, mas é também um dos filmes brasileiros mais bem-acabados dos últimos anos.

Quando o filme começa, em 1959, Heleno já está hospitalizado em um sanatório, com a memória abalada, fisicamente arrasado e aparentando bem mais do que seus 39 anos. É lá que ele começa a relembrar sua trajetória no mundo do futebol, quando era a maior estrela do Botafogo dos anos 40, adorado pelos torcedores e desejado pela mulherada em geral. Mesmo sem resistir aos encantos femininos que volta e meia lhe caíam ao colo, ele se casa com a bela Sílvia (Alline Moraes, linda como sempre), mas não desiste de criar problemas para seus treinadores e colegas de time - a quem considera extremamente inferiores a seu talento. Conforme o tempo passa, os problemas domésticos aumentam e chegam ao ápice quando ele é vendido ao Boca Juniors e vai morar (sozinho) na Argentina.

O interesse de Fonseca nem é tanto no Heleno jogador de futebol, ainda que o filme apresente algumas sequências muito bem editadas do esporte - que, a despeito de ser a maior paixão do país ainda não teve um filme decente que o retrate, com exceção de alguns poucos documentários. O que o cineasta (filho do escritor Rubem Fonseca) busca (e consegue, na maior parte do tempo) é entrar na alma de seu protagonista, retratar como seus desvios de conduta o levaram inexoravelmente ao declínio e à morte. O roteiro não chega a atingir todas as notas a que se propõe (por vezes tem-se a impressão de uma certa pressa em levar a estória adiante), mas a fotografia em preto-e-branco de Walter Carvalho é simplesmente devastadora, proporcionando ao filme uma identidade visual sóbria e elegante. Mas é inegável que o filme pertence a Rodrigo Santoro.

Até mesmo os detratores do ator - que também assina o filme como um dos produtores - são obrigados a reconhecer que estão diante de uma das grandes atuações do cinema nacional em muito, muito tempo. Em especial na sua decadência física, quando já não tem mais o brilho e o charme da juventude, o Heleno de Santoro é hipnotizante, melancólico, chocante - e a edição fragmentada colabora com o choque, comparando frequentemente a vitalidade do ídolo esportivo com a fragilidade do esportista esquecido e seriamente doente. Suas cenas com Alline Moraes emocionam de maneira sutil, sem apelar para o dramalhão, prova da inteligência de Fonseca em fugir da convencional piguice do tema.

Aliás, inteligência é o que não falta a "Heleno". Realizado com paixão e seriedade, é o tipo de filme de que o cinema brasileiro precisa cada vez mais. Belo, emocionante, relevante, "Heleno" é o que o indescritivelmente ruim "Estrela solitária" poderia ter sido se tivesse um diretor competente. Belo programa para fãs de esporte - e até para quem não é!

|
1

JOGOS VORAZES

Posted by Clenio on 19:54 in
Com o final da série "Harry Potter" e a iminente chegada do último capítulo da saga "Crepúsculo" - com a graça de Deus - os estúdios de Hollywood estavam desesperadamente ansiosos por uma nova possibilidade de franquia infanto-juvenil. Pois os executivos podem dormir tranquilos: com mais de 150 milhões de dólares arrecadados em seu fim-de-semana de estreia, o filme "Jogos vorazes", adaptado de uma trilogia escrita por Suzanne Collins já pode ser considerado um enorme sucesso - e suas continuações certamente irão render horrores mundo afora. A melhor notícia, porém, é que o filme é muito bom. Apesar de ter como público-alvo uma plateia mais adolescente (idade dos protagonistas), é capaz de agradar aos adultos dispostos a um bom entretenimento.

Dirigido por Gary Ross - que dirigiu o encantador "A vida em preto-e-branco" e o superestimado "Seabiscuit, alma de herói" - "Jogos vorazes" tem a seu favor uma heroína carismática (interpretada pela ótima Jennifer Lawrence, já indicada ao Oscar por "Inverno da alma"), um assunto momentoso (a febre dos reality shows + a violência) e uma história interessante o bastante para manter a plateia atenta durante toda a sua longa duração (mais de 140 minutos que passam rapidamente diante dos olhos do público). Ainda que demore a realmente começar - o que só acontece pela metade da projeção - o faz de maneira a apresentar devidamente suas personagens centrais e coadjuvantes (uma coleção de tipos bizarros vividos por gente do calibre de Donald Sutherland, Stanley Tucci e Woody Harrelson) antes da pancadaria. E para aqueles pais que se preocupam com o excesso de violência dos livros, um aviso: está tudo muito bem dosado no roteiro, sem exagero de nenhuma espécie - a Lionsgate não seria irresponsável de arriscar uma classificação etária que prejudicasse sua bilheteria, afinal de contas...

Para quem não sabe, "Jogos vorazes" se passa em um futuro distópico onde não existe mais a América do Norte e sim uma grande nação dividida em 12 distritos. Como castigo pela rebelião ocorrida décadas antes durante uma guerra, cada distrito deve, anualmente, ceder um casal de adolescentes para participar de um reality show com o mesmo nome do filme: nesse jogo, eles não lutam por dinheiro ou glória, e sim pelas próprias vidas, sendo assistidas fielmente por milhares de espectadores. Na edição de número 74 dos famigerados jogos, a adolescente Katniss Everdeen (Lawrence) entra como voluntária, para impedir a irmã caçula de participar da caçada humana. A seu lado entra o jovem Peeta Mellark (Josh Hutcherson, de "Minhas mães e meu pai"), apaixonado por ela mas sem esperanças de ser correspondido. Conforme o jogo avança, porém, os dois percebem que forjar um romance pode ajudá-los a chegar ao final da disputa.

Qualquer semelhança com os Big Brothers da vida não é apenas casual. A crítica feroz que os livros de Collins fazem ao gênero não é disfarçada no filme de Ross, apesar do relativo senso de humor com que o tema é tratado em alguns momentos (em especial quando está em cena o sempre competente Stanley Tucci no papel de um Pedro Bial mais exótico e menos chato). O roteiro se equilibra bem entre a ação, o romance e o drama, conduzindo tudo para um final devidamente climático e uma porta escancarada para novos filmes. Quem leu os livros sabe o que esperar. Aos outros cabe optar por correr às livrarias e comprar logo os dois últimos volumes ou aguardar ansiosamente a nova estreia....

|

Copyright © 2009 Lennys' Mind All rights reserved. Theme by Laptop Geek. | Bloggerized by FalconHive. Distribuído por Templates