0
A MAGNIFÍCIA "COLEÇÃO" DE MARISA MONTE
Posted by Clenio
on
00:25
in
MÚSICA
E lá se vão
quase trinta anos desde que a voz suave e ligeiramente rouca da carioca Marisa
Monte chegou pela primeira vez ao grande público, graças à inclusão, na trilha
sonora da novela “O salvador da pátria”, da bela canção “Bem que se quis”.
Descoberta por Nelson Motta enquanto cantava em bares da Itália, Marisa
conquistou crítica e ouvintes logo de cara, com um disco onde mostrava toda a
extensão de seu talento vocal em regravações que iam de Titãs e Mutantes até
Luiz Gonzaga, Candeia e, sofisticação das sofisticações, George e Ira Gershwin.
Quase uma dúzia de álbuns depois e consagrada como uma das cantoras mais
íntegras do país, com uma inteligente sobriedade na escolha do repertório e um
invejável controle da própria carreira (que a previne de lançar coletâneas ou
fazer as bisonhas visitas aos programas de televisão nacionais), Marisa
presenteou os fãs com um novo trabalho. Apesar do título e da proposta de
reunir no mesmo cd gravações que fazem um apanhado de suas características
musicais, “Coleção” soa como um álbum novo em folha. E o que é melhor: é uma
delícia do início ao fim.
A ideia de
“Coleção” é fabulosa, principalmente para os fãs: juntar em um mesmo pacote
treze músicas inéditas na discografia da cantora mas já presentes em discos
variados. Nem tudo é tão inédito assim (“Alta noite” já consta de “Cor de rosa
e carvão”, mas aparece por ser uma versão em parceria com Arnaldo Antunes, seu
colega no projeto Tribalistas, e “A primeira pedra”, em que ela divide o vocal
com o oscarizado Gustavo Santaolalla, faz parte de “Infinito particular”), mas,
entre duetos brilhantes, regravações fascinantes e faixas oriundas de trilhas
sonoras de cinema, Marisa desfila sua voz irretocável nos mais variados ritmos.
Uma prova de seu ecletismo – a principal característica apontada pela crítica
na ocasião de seu surgimento, em 1988 – é misturar, sem prejuízo algum,
Pixinguinha, Dorival Caymmi, Tom Jobim, Caetano Veloso e a Velha Guarda da
Portela com composições próprias, ao lado do já citado Arnaldo Antunes e de Carlinhos
Brown.
A delicadeza
de “Coleção” – que já é perceptível no belo projeto gráfico – começa com “Nu
com minha música”, de Caetano Veloso, que Marisa canta com Marcelo Amarante
(Los Hermanos) e Devendra Banhart e que faz parte do beneficente “Red Hot + Rio
2”. Da primeira edição do programa também foi resgatada uma inusitada versão de
“Águas de março” com o norte-americano David Byrne. A partir daí o público é
brindado com participações especiais de Julieta Venegas (“Ilusão”), Paulinho da
Viola (“Carinhoso”), da portuguesa Cesaria Evora (“É doce morrer no mar”) e da
Velha Guarda da Portela (“Volta, meu amor”).
Sem medo de
parecer brega, Marisa surpreende com a regravação de “Esqueça” – feita para a
trilha sonora do filme “A taça do mundo é nossa!”, do Casseta e Planeta – e
arrisca um tango com “Fumando espero”, com o grupo Café de Los Maestros, uma
das melhores faixas do disco. É de destacar também “Cama”, do filme “Era uma
vez”, em que Marisa brilha em um samba-canção que nada deve aos clássicos do
gênero – que, aliás, ela ajudou a revitalizar com um inestimável trabalho de
pesquisa que resultou em um documentário e inspirou o sensacional “Universo ao
meu redor”, recheado de belos exemplares da categoria. Inteligente e dona de
uma técnica excepcional, Marisa comprova, com “Coleção”, que até mesmo quando
lança um disco de, digamos assim, “sobras”, ainda é uma das vozes essenciais da
música popular brasileira, tão assombrada por subcelebridades cujo talento
parece residir somente na sua capacidade de auto-promoção.