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A CHAVE DE SARAH

Posted by Clenio on 11:54 in
A princípio, "A chave de Sarah" parece ser só mais um daqueles dramas que exploram o Holocausto judeu e que buscam a simpatia (e os Oscar) da Academia de Hollywood. No entanto, um olhar mais atento percebe que o filme do cineasta francês Gilles Paquet-Brenner tem mais a oferecer do que simplesmente cenas chocantes das crueldades cometidas com a desculpa da guerra - aliás, o filme é bastante discreto em relação a isso, preferindo não detalhar as atrocidades que todo mundo já conhece (e que o cinema não cansa de mostrar). A adaptação para o cinema do livro de Tatiana De Rosnay opta pelo lado emocional da situação, concentrando-se em uma trajetória individual (ou duas, dependendo do ponto de vista) ao invés de uma catarse coletiva. E tem como seu maior trunfo a atuação excelente de Kristin Scott-Thomas, cada vez mais se firmando como uma das maiores atrizes em atividade.

Scott-Thomas interpreta Julia Jarmond, uma jornalista americana que vive em Paris com o marido arquiteto e a filha pré-adolescente. Quando o filme começa, eles estão em vias de mudar-se para o antigo apartamento da família dele, um lugar amplo e bem localizado, mas carente de uma boa reforma. Enquanto a nova moradia não fica pronta, Julia se dedica a uma reportagem a respeito das centenas de judeus franceses expulsos de suas propriedades em julho de 1942 para ficarem presos em um velódromo até serem transferidos para campos de concentração (em um episódio pouco conhecido inclusive pelos franceses até o governo de Jaques Chirac, nos anos 90). Ela então descobre, atônita, que a casa para onde irá se mudar pertenceu a uma dessas famílias. Mesmo contra a vontade do sogro - que conhece toda a trágica história do apartamento - Julia vai atrás daquela que parece ser a única sobrevivente da família, uma mulher chamada Sarah Starzynski.

O roteiro de "A chave de Sarah" se alterna entre as investigações de Julia - tornadas ainda mais interessantes quando ela se descobre grávida sem contar com o apoio do marido - e os acontecimentos da vida da pequena Sarah (vivida pela ótima Mélusine Mayance), desde o momento em que é obrigada a abandonar sua casa juntamente com os pais (uma cena tensa que dá origem a todo o poderoso drama posterior) até seu melancólico desfecho (passando pelo chocante reencontro com o irmão que deixou trancado no armário de casa no momento da invasão). A edição enxuta de Hervé Schneid (que assinou o cultuado "O fabuloso destino de Amélie Poulain") também traduz o desejo do cineasta em manter um tom sóbrio, neutro e o mais distante possível de sentimentalismos forçados. A confiança do diretor em seu material é tanta que ele nem mesmo perde tempo (aplausos a ele) em mostrar cenas explícitas de violência física a não ser quando se faz estritamente necessário - e mesmo assim de maneira discreta mas eficaz. É na delicadeza de sua direção e nos olhares de suas atrizes centrais que se encontra toda a grandeza do filme.

Mesmo que não seja o melhor filme do gênero - e o final um tantinho clichê nem chega a incomodar - "A chave de Sarah" é um belo drama adulto, sério e realizado longe dos estúdios de Hollywood (o que já lhe dá uma certa confiabilidade artística um pouco maior). É emocionante sem ser piegas, é realista sem ser chocante e ainda por cima dá mais uma chance ao talento de Kristin Scott-Thomas e traz de volta às telas o sumido e ainda bom ator Aidan Quinn (na pele do filho de Sarah). Merece ser conferido!

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