PARA O BIEL
Querido Gabriel
Eu sei que normalmente textos como esse começam com o tradicional "Eu me lembro da primeira vez em que o vi..." , mas não vou mentir. A primeira lembrança que tenho de você é meio turva, nada clara. Só o que me lembro é de te pegar no colo, todo enrolado, sério e enorme apesar de ter apenas um ou dois dias. Lembro, no entanto, de pensar em como era estranho ter em meus braços o filho do meu irmão, e como isso de certa forma anunciava que novos tempos estavam chegando, tempos em que as brincadeiras infantis entre irmãos eram coisa do passado. A partir daquele momento específico, você, com poucos centímetros, passaria a ser o centro não só da vida dele, mas de toda a família. O primeiro filho, o primeiro neto, o primeiro sobrinho. Baita responsabilidade! E eu sei disso muito bem!!!!
Se não lembro nitidamente da primeira vez em que vi o seu rostinho me lembro perfeitamente das muitas tardes em que eu, ainda no período pré-responsabilidades empregatícias que me dominariam nos anos seguintes, fiquei cuidando de você, muitas vezes apenas te olhando, tentando te fazer absorver todo o amor que sentia por você. Você não lembra, mas eu lembro, de te fazer dormir cantando "Smile", do Chaplin (não sei se alguém sabia disso, mas agora é abertamente declarado...) enquanto sentia uma paz maior do que você. E não foram poucas as ocasiões em que eu acordava quando alguém te colocava a dormir do meu lado. E também não foram poucas as vezes em que seus gritos na janela (você adorava gritar, por puro prazer) me acordaram. Mas acordar de mau-humor ao te ver sorrindo era impossível.
Sim, me lembro de ter te dado banho e ter deixado shampoo escorrer para seus olhos, uma história que você adora ouvir - pelo menos até a idade adulta chegar e ela se transformar em mais uma daquelas anedotas que pais e mães adoram lembrar, mas que constrangem os protagonistas... Lembro que você adorava comer no meu colo, que chorava quando eu ia embora na hora de dormir e que demorou a dizer meu nome, se contentando em me chamar por um apelido que até hoje dividimos. Lembro de quando você abraçava todo mundo junto na cama, nos raros momentos em que a família inteira conseguia se reunir. E lembro principalmente do carinho que você sempre teve por mim, me acordando aos beijos quando eu voltava pra casa nos finais de semana. E recentemente descobri entre minhas coisas um cartão de Natal que você me fez há alguns anos que me emocionou profundamente.
Hoje você está quase um homem, e conversamos sobre "O poderoso chefão" assim como falávamos sobre "Toy story"... Quinze anos não é uma data qualquer! Mas sei que o que nos une não tem data, não tem tempo, não tem idade que apague. Mais do que um tio eu espero que você me considere seu amigo de todas as horas, em qualquer situação. Te amo muitíssimo!