LIVE FAST, DIE YOUNG
Não sei exatamente quando começou meu fascínio por James Dean. Só sei que foi há muito tempo, provavelmente depois que assisti, de madrugada, a um de seus três filmes. Desde então, o sentimento nunca arrefeceu, recrudescendo vez ou outra, como uma espécie de "paixão sazonal". Sempre que me cai nas mãos algum material sobre o eterno Cal Trask de "Vidas amargas", imediatamente sou tragado por ele, voltando a mergulhar no seu universo particular. Foi assim ano passado com o livro "Boulevard of broken dreams: life, times and legend of James Dean", de Paul Alexander - que centrava sua atenção na vida sexual do ator - e foi assim nessa última semana, quando estive absorto na leitura de "Live fast, die young: the wild ride of making 'Rebel without a cause'", de Lawrence Frascella e Al Weisel. Inédito em português, o livro, como o título explicita, conta, com detalhes, o processo de realização do filme "Juventude transviada" e a forma como ele transformou - para muito melhor - a maneira com que Hollywood via seus jovens e adolescentes.
Em 1955, o nível de delinquência juvenil atingia índices alarmantes nos EUA, chegando até mesmo a obrigar à criação de uma comissão encarregada de estudá-la e tentar diminuí-la. Paradoxalmente, o cinema da época parecia não se importar com o público jovem, retratando-o sempre de maneira superficial e/ou equivocada. Com o objetivo de mudar esse panorama e realizar o definitivo filme sobre a geração imediatamente posterior à sua, o cineasta Nicholas Ray convenceu a Warner Brothers a financiar o projeto, não sem antes tomar o cuidado de ser o principal responsável por todas as decisões artísticas relacionadas a ele. Esse seu insight teve dois efeitos distintos: ele tornou-se um queridinho da revista francesa "Cahiers du cinèma" - que o considerou um dos principais "autheurs" do cinema americano anos depois -, mas, em compensação, teve muitas - MUITAS - dores de cabeça durante as filmagens.
A principal dor de cabeça que o diretor teve chamava-se Natalie Wood, que, até então, aos meros dezessete anos, tinha uma carreira de estrela infantil. Para conseguir o principal papel feminino do filme, que ela considerava sua grande chance de ingressar pra valer no mundo dos atores adultos a jovem Wood não se fez de rogada e usou de todas as armas que possuía, e isso incluía dormir com o diretor de 43 anos. Fugindo da marcação cerrada da mãe, Natalie não só teve um caso com Ray - que lhe deu o empurrão necessário para o sucesso - mas também com seu colega de elenco Dennis Hopper e só não dormiu também com James Dean porque ele não era exatamente chegado na coisa - o que fica bem explícito no livro, quando os autores revelam, sem meias-palavras que a bissexualidade do jovem astro nunca foi segredo para ninguém que conviveu com ele. Dean chegou inclusive a propor que seu amigo/namorado/amante da época, o ator Jack Simmons fosse escolhido para o crucial papel de Plato, o terceiro protagonista do filme. Simmons ficou com um papel menor - quase de figuração - de integrante da gangue de transviados, porque a produção achou que ele era efeminado demais para o papel. Levando-se em consideração que quem interpretou Plato foi Sal Mineo é de se imaginar o grau de delicadeza de Simmons, não??
"Live fast, die young" detalha as filmagens de cada uma das cruciais cenas de "Juventude transviada", deixando claras todas as intenções de Ray e de seu roteirista Stewart Stern em cada sequência, cada enquadramento, cada escolha feita, desde o elenco (que reunia veteranos do teatro a uma equipe de jovens buscando o estrelato) até cada movimento de câmera. Depois de ler o livro é impossível assistir-se ao filme da mesma maneira, uma vez que até mesmo suas mensagens mais subliminares ficam patentes e comprovam o talento e a visão de futuro de Ray, que conseguiu realizar não apenas um pedaço de bom - e eterno - entretenimento, mas também um documento de uma época e um objeto de culto que cresce sem dar sinais de cansaço.
E o culto a "Juventude transviada" é o assunto do capítulo final do livro dos jornalistas Frascella e Weisel. Eles citam cada influência que o filme de Ray causou na cultura mundial - algumas óbvias outras nem tanto. Ficamos sabendo que Dean e sua turma tem ídolos do porte de Bob Dylan, Bruce Springsteen e Morrisey, que Elvis Presley sabia de cor os diálogos do filme - e até namorou Natalie Wood por um tempinho... Natalie, inclusive, é motivo de um dos mais interessantes dos trechos finais do livro. Para encerrar sua narrativa, os autores resumem os anos restantes de Wood e Mineo (que sofreram mortes violentas, conforme previra Dean durante as filmagens), analisando suas carreiras e vidas pessoais de forma imparcial e objetiva.
Fofocas de bastidores existem aos borbotões em "Live fast, die young". Mas cuidadosamente colocadas entre informações pertinentes e análises inteligentes elas não soam como parte de uma edição especial de uma "Contigo" da vida. É um livro essencial para fãs de James Dean, de "Juventude transviada" e de cinema em geral.