UM SONHO POSSÍVEL
E eu que achava que um filme não poderia ser pior do que "A caixa"... Doce ilusão. O cinema, assim como tem o dom de me maravilhar constantemente também consegue me decepcionar amargamente, vez ou outra. E nos últimos dias, o vem fazendo com uma frequência assustadora. Primeiro, o suspense pseudo-intelectual de Richard Kelly (se bem que usar a palavra "intelectual" para referir-se a um filme com Cameron Diaz é forçar muito a barra). E agora, "Um sonho possível", um inacreditável drama edificante que deu um inpensável Oscar de melhor atriz a Sandra Bullock. E uso o adjetivo "impensável" pra não dizer "imerecido", "injusto" e "ridículo", porque todas essas características seriam apropriadas, no caso.
É difícil crer que os membros da Academia não conseguiram encontrar 10 filmes decentes no ano de 2009 para indicar ao prêmio máximo - a única justificativa plausível para que o filme tenha encontrado uma vaga entre os finalistas. Baseado em uma história real, o resultado final é um drama vagabundo, que carece de emoção e empatia e, pior do que tudo, é longo, arrastado e caricato ao extremo. Bullock, vestida de perua (cadê o desafio interpretativo aí??) faz o papel de Leigh Anne Tuoyh, uma socialite fútil e vazia que, um belo dia, do nada, resolve cuidar e proteger um jovem de 17 anos problemático, negro, enorme e criado em um bairro violento. Contando com o apoio da família, ela não apenas o salva de um trágico destino como ainda consegue colocá-lo na universidade, graças a seu dom como esportista. Lindo, não? Pena que esse conto de fadas moderno é contado de forma burocrática, pra não dizer preguiçosa.
É inacreditável que Sandra Bullock tenha levado o Oscar por uma atuação tão canhestra e limitada, tendo em vista que disputava o prêmio com Meryl Streep, Helen Mirren e a promissora Carey Mulligan. Em nenhuma - NENHUMA - cena ela mostra mais do que as caras e bocas com que vem "premiando" o público desde que pegou carona no ônibus desgovernado pilotado por Keanu Reeves em "Velocidade máxima". Em comédias românticas até que ela funciona - em algumas, porque "A proposta", por exemplo, já é de chorar - porque não é muito exigida. Mas aqui, tentando se reinventar como atriz séria só o que desperta é pena. Sua personagem - ainda que inspirada em uma pessoa real - não convence absolutamente. É difícil acreditar, por exemplo, que uma mulher como ela possa botar medo em um grupo de marginais apenas ameaçando verbalmente. E isso que nem vou falar das tentativas pífias do roteiro em fazer humor. Todas - TODAS - as piadas são requentadas, patéticas e só podem fazer rir todos aqueles americanos sem noção de qualidade artística que lotaram os cinemas para assistir a essa porcaria. Como diria Nelson Rodrigues, o clichê "pinga do teto e escorre pelas paredes", em diálogos que fariam corar o elenco de "Malhação".
É quase certo que o Oscar pra Sandra Bullock foi uma espécie de prêmio porque ela foi a atriz mais rentável do ano passado (seus dois filmes foram campeões de bilheteria - nem vou citar um terceiro, pelo qual ela levou um provavelmente merecido Framboesa de Ouro). Mas para isso eles poderiam ter lhe dado um carro, um cheque ou um Rolex. Tudo bem que até mesmo Roberto Benigni tem um Oscar, mas é por coisas assim que a cada ano que passa o prestígio da Academia diminui consideravelmente entre aqueles que realmente amam Cinema (com C maiúsculo).
PS - Sandra Bullock consegue fazer outra cara além da mesma que ela apresenta durante todos os excruciantes 130 minutos de projeção?