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FOXCATCHER - A HISTÓRIA QUE CHOCOU O MUNDO
Posted by Clenio
on
20:01
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CINEMA 2015
Se existe um caminho para conquistar o coração dos eleitores da Academia, esse caminho deve ser do conhecimento do diretor Bennett Miller. Desde que lançou seu primeiro longa - a cinebiografia "Capote", que contava com a brilhante atuação de Philip Seymour Hoffman como o famoso autor de "À sangue frio" - o cineasta nova-iorquino viu seus três filmes conquistarem importantes indicações ao Oscar: o primeiro e "O homem que mudou o jogo" - estrelado por Brad Pitt e Jonah Hill - chegaram mesmo a concorrer à estatueta de melhor filme, apesar da qualidade apenas razoável do segundo. Seu novo trabalho (e novamente uma história verdadeira) é "Foxcatcher, uma história que chocou o mundo", que, apesar de não ter alcançado a glória de ser indicado na categoria de de melhor filme, está no páreo de direção, ator (um irreconhecível Steve Carrell), ator coadjuvante (Mark Ruffalo) e roteiro original. Tido como um dos favoritos às estatuetas desde que estreou no Festival de Cannes, em maio passado, o filme foi aos poucos perdendo fôlego e, se conseguiu atravessar a cobiçada linha que separa as especulações da realidade é porque conta com um invejável conjunto de atores, todos eles em momento de grande inspiração. No cômputo geral, "Foxcacther" está muito longe de ser o filme memorável que poderia ser.
O subtítulo nacional - "A história que chocou o mundo" - já é um exagero desproporcional, uma vez que, antes da estreia mundial, pouca gente sabia a respeito da tragédia que deu origem ao roteiro (ao menos fora dos EUA, onde os personagens eram relativamente famosos), mas não é a pior coisa do filme de Miller, que sofre de uma direção distante e impessoal que lhe dá um equivocado tom de semi-documentário - uma opção discutível que acaba por afastar o envolvimento emocional do espectador com uma história já recheada de personagens ambíguos e frios. Mesmo que em certos momentos crie algumas cenas de inegável impacto visual - que acentuam o viés melancólico e denso da trama - o cineasta incorre no erro de evitar qualquer mudança no ritmo quase letárgico de sua narração, dando a todos os acontecimentos mostrados a mesma importância dramática. O que poderia ser inteligente - ir montando aos poucos um quebra-cabeças de peças aparentemente desconexas - acaba por se mostrar apenas aborrecido quando se percebe, ao final, que todos aqueles momentos silenciosos e repetitivos não ajudaram em nada a entender o principal: o que levou o milionário John Du Pont a tomar a drástica atitude que inspirou o subtítulo em português.
Não saber muito a respeito da trama ajuda a manter o clima de suspense que, de certa forma, é um dos trunfos de "Foxcatcher" - mesmo que não se conheça a história fica claro desde o princípio que algo pouco positivo irá resultar da aproximação dos personagens, principalmente porque, reconheçamos, a trilha sonora e a edição soturna deem dicas a esse respeito. Tudo começa quando o jovem Mark Schultz (Channing Tatum), lutador olímpico que vive de treinos e palestras motivacionais a estudantes enfadados, é convidado a visitar a mansão do milionário John Du Pont (Steve Carrell sem o menor tique cômico), que vive isolado em uma gigantesca propriedade e tem como sonho criar uma vitoriosa equipe norte-americana de lutadores. Ele mesmo um treinador e lutador diletante, Du Pont convence o jovem a juntar-se a outros atletas, dando-lhe um lugar para morar, comida, boas condições de treino e um pagamento generoso. A única pedra em seu caminho é Dave (Mark Ruffalo), irmão mais velho e antigo técnico de Mark, com quem mantém uma forte relação de carinho familiar. A união entre os dois passa a despertar um misto de inveja e admiração no multi-milionário - que não tem o melhor dos relacionamentos com a mãe (Vanessa Redgrave) e leva uma vida solitária - que resolve, então, chamar Dave para juntar-se a eles em seu projeto.
Contando sua história sem pressa e muitas vezes abusando da paciência do público, Bennett Miller tem como maior trunfo sua trinca de atores centrais. Enquanto Mark Ruffalo já é reconhecido por seu talento dramático graças a uma série de bons filmes - que incluem a comédia dramática "Minhas mães e meu pai", que lhe deram sua primeira indicação ao Oscar, em 2011 - a plateia é pega de surpresa principalmente pelo trabalho de Steve Carrell e Channing Tatum. Tatum, mais conhecido por exibir o físico privilegiado em dramas românticos como "Querido John" e comédias bobas como "Anjos da lei", ainda não é um grande ator, mas seu esforço em crescer artisticamente é visível na construção corporal de seu personagem, que foge do estereótipo do galã sedutor com seu andar pesado, seu olhar perdido e sua forma quase anestesiada de falar. E Steve Carrell merece com todo o louvor sua indicação à estatueta de melhor ator, apresentando um desenvolvimento exemplar de personagem: mesmo que pouco se explique a respeito de sua natureza no roteiro, ele consegue, através do olhar vazio e das expressões faciais destituídas de qualquer emoção, arrepiar e emocionar na medida certa. Em nenhum momento somos lembrados que, por trás da competente maquiagem e da voz monocórdia, existe o genial ator cômico do seriado "The Office" e da refilmagem de "Agente 86". Ponto para ele.
No fim das contas, "Foxcatcher" é um trabalho apenas ok de um diretor que caiu inexplicavelmente nas graças da Academia. A intenção do cineasta em retratar o mundo da luta como uma espécie de culto - um mundo à parte, isolado e cheio de regras - cai no vazio diante de um roteiro que deixa mais à imaginação do público do que deveria e o final anti-climático perde a oportunidade de chocar ou surpreender para parecer apenas mais um acontecimento banal como um treino ou uma corrida matinal. Nem mesmo as possibilidades homoeróticas da história são levantadas, tornando tudo apenas um exercício sonolento e quase arrogante. Ainda bem que tem seus atores.
O subtítulo nacional - "A história que chocou o mundo" - já é um exagero desproporcional, uma vez que, antes da estreia mundial, pouca gente sabia a respeito da tragédia que deu origem ao roteiro (ao menos fora dos EUA, onde os personagens eram relativamente famosos), mas não é a pior coisa do filme de Miller, que sofre de uma direção distante e impessoal que lhe dá um equivocado tom de semi-documentário - uma opção discutível que acaba por afastar o envolvimento emocional do espectador com uma história já recheada de personagens ambíguos e frios. Mesmo que em certos momentos crie algumas cenas de inegável impacto visual - que acentuam o viés melancólico e denso da trama - o cineasta incorre no erro de evitar qualquer mudança no ritmo quase letárgico de sua narração, dando a todos os acontecimentos mostrados a mesma importância dramática. O que poderia ser inteligente - ir montando aos poucos um quebra-cabeças de peças aparentemente desconexas - acaba por se mostrar apenas aborrecido quando se percebe, ao final, que todos aqueles momentos silenciosos e repetitivos não ajudaram em nada a entender o principal: o que levou o milionário John Du Pont a tomar a drástica atitude que inspirou o subtítulo em português.
Não saber muito a respeito da trama ajuda a manter o clima de suspense que, de certa forma, é um dos trunfos de "Foxcatcher" - mesmo que não se conheça a história fica claro desde o princípio que algo pouco positivo irá resultar da aproximação dos personagens, principalmente porque, reconheçamos, a trilha sonora e a edição soturna deem dicas a esse respeito. Tudo começa quando o jovem Mark Schultz (Channing Tatum), lutador olímpico que vive de treinos e palestras motivacionais a estudantes enfadados, é convidado a visitar a mansão do milionário John Du Pont (Steve Carrell sem o menor tique cômico), que vive isolado em uma gigantesca propriedade e tem como sonho criar uma vitoriosa equipe norte-americana de lutadores. Ele mesmo um treinador e lutador diletante, Du Pont convence o jovem a juntar-se a outros atletas, dando-lhe um lugar para morar, comida, boas condições de treino e um pagamento generoso. A única pedra em seu caminho é Dave (Mark Ruffalo), irmão mais velho e antigo técnico de Mark, com quem mantém uma forte relação de carinho familiar. A união entre os dois passa a despertar um misto de inveja e admiração no multi-milionário - que não tem o melhor dos relacionamentos com a mãe (Vanessa Redgrave) e leva uma vida solitária - que resolve, então, chamar Dave para juntar-se a eles em seu projeto.
Contando sua história sem pressa e muitas vezes abusando da paciência do público, Bennett Miller tem como maior trunfo sua trinca de atores centrais. Enquanto Mark Ruffalo já é reconhecido por seu talento dramático graças a uma série de bons filmes - que incluem a comédia dramática "Minhas mães e meu pai", que lhe deram sua primeira indicação ao Oscar, em 2011 - a plateia é pega de surpresa principalmente pelo trabalho de Steve Carrell e Channing Tatum. Tatum, mais conhecido por exibir o físico privilegiado em dramas românticos como "Querido John" e comédias bobas como "Anjos da lei", ainda não é um grande ator, mas seu esforço em crescer artisticamente é visível na construção corporal de seu personagem, que foge do estereótipo do galã sedutor com seu andar pesado, seu olhar perdido e sua forma quase anestesiada de falar. E Steve Carrell merece com todo o louvor sua indicação à estatueta de melhor ator, apresentando um desenvolvimento exemplar de personagem: mesmo que pouco se explique a respeito de sua natureza no roteiro, ele consegue, através do olhar vazio e das expressões faciais destituídas de qualquer emoção, arrepiar e emocionar na medida certa. Em nenhum momento somos lembrados que, por trás da competente maquiagem e da voz monocórdia, existe o genial ator cômico do seriado "The Office" e da refilmagem de "Agente 86". Ponto para ele.
No fim das contas, "Foxcatcher" é um trabalho apenas ok de um diretor que caiu inexplicavelmente nas graças da Academia. A intenção do cineasta em retratar o mundo da luta como uma espécie de culto - um mundo à parte, isolado e cheio de regras - cai no vazio diante de um roteiro que deixa mais à imaginação do público do que deveria e o final anti-climático perde a oportunidade de chocar ou surpreender para parecer apenas mais um acontecimento banal como um treino ou uma corrida matinal. Nem mesmo as possibilidades homoeróticas da história são levantadas, tornando tudo apenas um exercício sonolento e quase arrogante. Ainda bem que tem seus atores.