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DEUS É MEU CAMARADA
Posted by Clenio
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00:52
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LITERATURA
Que minha mãe nunca leia esse post, mas já faz algum tempo que minhas relações com Deus estão seriamente estremecidas. Respeito, tudo bem, não quero arrumar briga com ninguém, mesmo porque religião sempre é um assunto muito delicado. Mas eu, na boa, na boa, não consigo entender certas atitudes dEle, não só em relação a mim, o que seria no mínimo bastante egoísta mas também em relação ao mundo em geral. Talvez por isso, por essa minha ululante lacuna de fé, eu tenha gostado tanto do livro "Deus é meu camarada" (Ed. Suma de letras), do escritor francês Cyril Massarotto. Com muito bom-humor e um senso de ritmo invejável (talvez por ser letrista de rock nas horas vagas), Massarotto construiu uma narrativa que beira o surreal mas que, estranhamente, faz todo o sentido do mundo.
O protagonista, cujo nome em nenhum momento é citado, é um homem comum de 30 anos que trabalha como vendedor de sex-shop. Vivendo uma existência absolutamente prosaica, um belo dia ele passa a ver e ouvir Deus, sem nenhum motivo aparente. Depois de acostumar-se com a ideia, ele começa a ter uma relação de amizade e confiança com o Ser Supremo, que lhe explica o universo, a vida, e, o que não é nada mal, lhe aproxima de Alice, que virá a ser a mulher de sua vida. O livro acompanha a amizade entre os dois por trinta anos, período no qual Deus tentará fazer com que seu novo pupilo entenda o motivo pelo qual foi escolhido e compreenda de maneira racional os fatos que alteraram drasticamente sua vida.
Na verdade, "Deus é meu camarada" não pode ser considerado um livro essencial para aqueles que procuram ler apenas clássicos, ou os mais vendidos da Veja. É bem provável, aliás, que passe quase em brancas nuvens dentre as dezenas de lançamentos que chegam às livrarias semanalmente. Sua linguagem não é rebuscada - muito pelo contrário, é de uma simplicidade franciscana -, não tem lances romanescos de suspense e tampouco super-heróis como protagonistas - a não ser que se veja Deus como tal. É simplesmente um livro bastante agradável, leve e nem mesmo seus momentos mais emocionantes chegam a tirar o prazer da leitura. Algumas passagens beiram o piegas, mas é quase impossível não comover-se com as boas intenções do autor em conquistar pelo humor para dar a sua visão de Deus da maneira menos dogmática possível.
Pelo bem, pelo mal, vale a pena conhecer "Deus é meu camarada". Senão pelos deliciosos diálogos ou por alguns insights bastante interessantes, ao menos para que se comece - ou no meu caso volte a - tentar entender os motivos pelos quais essa força superior chamada Deus quase sempre parece ignorar nossos pedidos e fazer as coisas a Seu modo.
"Acho que os soníferos que a gente engole depois de adulto são as canções de ninar que não cantaram pra nós quando éramos crianças."