0
A GAROTA DINAMARQUESA
Posted by Clenio
on
18:56
in
CINEMA 2016
Na Dinamarca da década de 1920, um jovem casal de pintores - ele já reconhecido, ela engatinhando no mercado - tem sua vida modificada drasticamente quando o rapaz começa a deixar crescer dentro de si uma personalidade feminina, que o leva inclusive a ser um dos primeiros pacientes do mundo a submeter-se a uma cirurgia de mudança de sexo. Apesar das dificuldades, porém, a amizade entre eles permanece inabalada e até fortalecida pelos percalços que enfrentam na difícil trajetória para a aceitação da sociedade. Lindo, não? A história real do artista plástico Einar Wegener - contada em forma de romance pelo escritor David Ebershoff - tem todos os elementos necessários para um filme inesquecível, e a atriz Nicole Kidman percebeu isso, comprando os direitos do livro e reservando para si o papel central (masculino!). Porém, como em Hollywood nem tudo anda tão depressa quanto se pode pensar, Kidman acabou passando o projeto adiante - depois que atrizes de gabarito, como Charlize Theron, Gwyneth Paltrow, Marion Cottilard, Uma Thurman e Rachel Weisz, que interpretariam sua mulher, também abandonaram o barco - e "A garota dinamarquesa" caiu no colo de Tom Hooper, vencedor do Oscar por "O discurso do rei" e comandante da soporífera versão cinematográfica de "Os miseráveis". A boa notícia é que o filme finalmente saiu - baseado no livro de Ebershoff e não na história real de Wegener, bem menos asséptica e romântica. A má é que Hooper continua sendo um cineasta medíocre e limitado, incapaz de atingir todas as possibilidades da grande trama que tinha em mãos. Felizmente nem tudo está perdido, uma vez que nem mesmo a burocracia de sua direção consegue impedir que seus dois atores centrais, Eddie Redmayne e Alicia Vikander, entreguem irretocáveis atuações - merecidamente indicadas ao Oscar.
Premiado pela Academia ano passado, por seu desempenho em "A teoria de tudo", Redmayne fisgou o papel principal durante as filmagens de "Os miseráveis" e se mostra à altura do novo desafio. Calcando seu trabalho na sutileza e nos pequenos detalhes, ele percorre o caminho inverso de sua premiada atuação como Stephen Hawking, ao buscar seu personagem não apenas no visual, mas principalmente em seus conflitos internos. Seus gestos discretos e seus olhares divididos entre o desejo e a angústia são provas incontestáveis de seu talento, que transcende até mesmo um roteiro pouco inspirado, que trata uma história potente e corajosa com um respeito excessivo, quase com medo de ultrapassar os limites do que o público-médio pode considerar bom-gosto. A direção de Hooper parece ter medo de ofender a plateia conservadora e acaba por ficar em um incômodo meio-termo, que torna superficial a discussão sobre transgênero para contar uma história de amor - que, apesar de bela, está muito distante da verdadeira. Mesmo que o filme seja baseado em uma versão romanceada da trajetória de Wegener/Lili Elbe, não deixa de ser incômodo perceber o tom fantasioso e excessivamente açucarado da narrativa, fatores que nem mesmo a excepcional reconstituição de época e a sublime trilha sonora de Alexandre Desplat conseguem disfarçar.
Mas, apesar dos pesares, "A garota dinamarquesa" tem seus méritos - mais até do que os dois trabalhos anteriores de Hooper. Se Eddie Redmayne brilha com uma atuação sublime e muito maior do que o filme em si, sua colega de cena, Alicia Vikander, merece todo o auê que vem causando. Além de ter chamado a atenção como a androide de "Ex-machina" (indicado aos Oscar de roteiro original e efeitos visuais), ela transpira verdade em cada cena como Gerda Wegener, injetando emoção e sentimento em uma personagem de grande complexidade. É ela, acompanhada de Redmayne - e do ótimo Matthias Schonaerts (de "Ferrugem e osso") na pele de um amigo de infância de Einar/Lili - que faz com que o filme ultrapasse as limitações de sua direção opaca para atingir a plateia. Redmayne provavelmente irá perder o Oscar para Leonardo DiCaprio, mas Vikander tem boas chances de levar a estatueta de coadjuvante (ainda que seja tão protagonista quanto seu colega de cena). Em mãos de um cineasta realmente talentoso, eles poderiam ter realizado um épico inesquecível. Sob o comando de Tom Hooper eles fizeram mais do que se poderia esperar.
Premiado pela Academia ano passado, por seu desempenho em "A teoria de tudo", Redmayne fisgou o papel principal durante as filmagens de "Os miseráveis" e se mostra à altura do novo desafio. Calcando seu trabalho na sutileza e nos pequenos detalhes, ele percorre o caminho inverso de sua premiada atuação como Stephen Hawking, ao buscar seu personagem não apenas no visual, mas principalmente em seus conflitos internos. Seus gestos discretos e seus olhares divididos entre o desejo e a angústia são provas incontestáveis de seu talento, que transcende até mesmo um roteiro pouco inspirado, que trata uma história potente e corajosa com um respeito excessivo, quase com medo de ultrapassar os limites do que o público-médio pode considerar bom-gosto. A direção de Hooper parece ter medo de ofender a plateia conservadora e acaba por ficar em um incômodo meio-termo, que torna superficial a discussão sobre transgênero para contar uma história de amor - que, apesar de bela, está muito distante da verdadeira. Mesmo que o filme seja baseado em uma versão romanceada da trajetória de Wegener/Lili Elbe, não deixa de ser incômodo perceber o tom fantasioso e excessivamente açucarado da narrativa, fatores que nem mesmo a excepcional reconstituição de época e a sublime trilha sonora de Alexandre Desplat conseguem disfarçar.
Mas, apesar dos pesares, "A garota dinamarquesa" tem seus méritos - mais até do que os dois trabalhos anteriores de Hooper. Se Eddie Redmayne brilha com uma atuação sublime e muito maior do que o filme em si, sua colega de cena, Alicia Vikander, merece todo o auê que vem causando. Além de ter chamado a atenção como a androide de "Ex-machina" (indicado aos Oscar de roteiro original e efeitos visuais), ela transpira verdade em cada cena como Gerda Wegener, injetando emoção e sentimento em uma personagem de grande complexidade. É ela, acompanhada de Redmayne - e do ótimo Matthias Schonaerts (de "Ferrugem e osso") na pele de um amigo de infância de Einar/Lili - que faz com que o filme ultrapasse as limitações de sua direção opaca para atingir a plateia. Redmayne provavelmente irá perder o Oscar para Leonardo DiCaprio, mas Vikander tem boas chances de levar a estatueta de coadjuvante (ainda que seja tão protagonista quanto seu colega de cena). Em mãos de um cineasta realmente talentoso, eles poderiam ter realizado um épico inesquecível. Sob o comando de Tom Hooper eles fizeram mais do que se poderia esperar.