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A GRANDE APOSTA
Posted by Clenio
on
19:07
in
CINEMA 2016
É difícil julgar um filme como "A grande aposta" - indicado a 5 Oscar 2016 e com boas chances de vitória na categoria principal, já que foi eleito o melhor do ano pelo Sindicato dos Produtores, sempre um importante termômetro das tendências da Academia - sem que se tenha um amplo conhecimento de conceitos e teorias econômicas. Mesmo que o criativo roteiro tente simplificar as coisas e deixá-las razoavelmente aplicáveis ao dia-a-dia do espectador médio, tal providência não é o bastante para fazer com que o público desacostumado a termos técnicos como "tranches", "subprimes" e "obrigações hipotecárias" seja capaz de acompanhar todos os detalhes do novo trabalho de Adam McKay - que saiu direto do despretensioso "Tudo por um furo" para conquistar uma vaga entre os cinco diretores indicados à estatueta mais cobiçada do cinema. Tratar de um assunto relevante mas pouco acessível, porém, não impediu que o filme rendesse mais de 60 milhões de dólares nas bilheterias americanas - responsabilidade também do elenco estelar, liderado por Steve Carrell, Ryan Gosling, Brad Pitt e Christian Bale (que também encontrou uma vaga entre os indicados da categoria de ator coadjuvante) - e recebesse elogios unânimes de todos os lados. Mas será que todo esse auê é merecido ou é apenas mais uma alucinação coletiva que volta e meia acomete os críticos?
É possível que as duas respostas sejam certas. Como narrativa, "A grande aposta" é um triunfo. O roteiro é mordaz, com senso de ritmo e belas sacadas (como o fato do personagem de Ryan Gosling quebrar a quarta parede e falar diretamente com o espectador, como forma de aproximá-lo do que está acontecendo na tela) e a edição é excepcional, ao utilizar imagens de arquivo para localizar a trama em termos cronológicos e enfatizar a série de ironias que desfilam diante dos olhos da plateia. Os personagens são complexos e escapam com maestria do politicamente correto e do maniqueísmo e seus intérpretes são acima de qualquer suspeita - a lembrança de Christian Bale entre os candidatos ao Oscar é justa e Steve Carrell também merecia uma indicação. No entanto, é extremamente difícil a conexão emocional da audiência com uma história tão cheia de pormenores: em determinado ponto, é preciso decidir entre tentar entender os desdobramentos da trama ou acompanhar a trajetória dos personagens envolvidos nela (e como uma coisa depende da outra, dá pra ver o tamanho do problema).
Resumindo em poucas linhas, "A grande aposta" conta como o excêntrico milionário Michael Burry (Christian Bale), ao analisar o mercado imobiliário de 2001, conseguiu prever a imensa crise que irrompeu nos EUA sete anos depois e fez uso de tal informação para lucrar em cima de hipotecas consideradas seguras pelos bancos americanos. Além dele, o roteiro também acompanha outros ambiciosos homens que entraram na jogada - por motivos os mais variados - como Mark Baum (Steve Carrell), traumatizado pelo suicídio do irmão, Jared Vennett (Ryan Gosling), que narra a história, e a dupla de jovens empresários de fundo de quintal Charlie Geller (John Magaro) e Jamie Shipley (Finn Wittrock) que veem na oportunidade única a chance de tornarem-se os bilionários que desejam ser. Todos são desprovidos de consciência e tem como principal objetivo a fortuna fácil. As consequências de sua ganância são o que menos lhes importa. E é aí que reside outro ponto positivo do filme.
Ao abdicar da regra de ouro dos roteiristas - ter ao menos um herói com quem o público possa se identificar - "A grande aposta" corria um risco tremendo, mas por incrível que pareça essa ousadia não atrapalha seu desenvolvimento. É bom ver um filme comercial que despreza as convenções do mercado. Porém, ao contrário do que acontecia em "O lobo de Wall Street", por exemplo - que coincidentemente versava sobre o mesmo universo das finanças - a conexão entre público e personagens inexiste, não devido à falta de caráter de todos eles, mas porque o roteiro complexo em demasia impede que ela aconteça. Dá pra rir em alguns momentos e até se emocionar em outros - cortesia de Steve Carrell - mas no geral falta à "A grande aposta" um elo de ligação entre audiência e personagens. Um pecado considerável, mas que não consegue apagar suas qualidades. Se vale o Oscar, porém, é uma questão polêmica que talvez nunca seja totalmente esclarecida.
É possível que as duas respostas sejam certas. Como narrativa, "A grande aposta" é um triunfo. O roteiro é mordaz, com senso de ritmo e belas sacadas (como o fato do personagem de Ryan Gosling quebrar a quarta parede e falar diretamente com o espectador, como forma de aproximá-lo do que está acontecendo na tela) e a edição é excepcional, ao utilizar imagens de arquivo para localizar a trama em termos cronológicos e enfatizar a série de ironias que desfilam diante dos olhos da plateia. Os personagens são complexos e escapam com maestria do politicamente correto e do maniqueísmo e seus intérpretes são acima de qualquer suspeita - a lembrança de Christian Bale entre os candidatos ao Oscar é justa e Steve Carrell também merecia uma indicação. No entanto, é extremamente difícil a conexão emocional da audiência com uma história tão cheia de pormenores: em determinado ponto, é preciso decidir entre tentar entender os desdobramentos da trama ou acompanhar a trajetória dos personagens envolvidos nela (e como uma coisa depende da outra, dá pra ver o tamanho do problema).
Resumindo em poucas linhas, "A grande aposta" conta como o excêntrico milionário Michael Burry (Christian Bale), ao analisar o mercado imobiliário de 2001, conseguiu prever a imensa crise que irrompeu nos EUA sete anos depois e fez uso de tal informação para lucrar em cima de hipotecas consideradas seguras pelos bancos americanos. Além dele, o roteiro também acompanha outros ambiciosos homens que entraram na jogada - por motivos os mais variados - como Mark Baum (Steve Carrell), traumatizado pelo suicídio do irmão, Jared Vennett (Ryan Gosling), que narra a história, e a dupla de jovens empresários de fundo de quintal Charlie Geller (John Magaro) e Jamie Shipley (Finn Wittrock) que veem na oportunidade única a chance de tornarem-se os bilionários que desejam ser. Todos são desprovidos de consciência e tem como principal objetivo a fortuna fácil. As consequências de sua ganância são o que menos lhes importa. E é aí que reside outro ponto positivo do filme.
Ao abdicar da regra de ouro dos roteiristas - ter ao menos um herói com quem o público possa se identificar - "A grande aposta" corria um risco tremendo, mas por incrível que pareça essa ousadia não atrapalha seu desenvolvimento. É bom ver um filme comercial que despreza as convenções do mercado. Porém, ao contrário do que acontecia em "O lobo de Wall Street", por exemplo - que coincidentemente versava sobre o mesmo universo das finanças - a conexão entre público e personagens inexiste, não devido à falta de caráter de todos eles, mas porque o roteiro complexo em demasia impede que ela aconteça. Dá pra rir em alguns momentos e até se emocionar em outros - cortesia de Steve Carrell - mas no geral falta à "A grande aposta" um elo de ligação entre audiência e personagens. Um pecado considerável, mas que não consegue apagar suas qualidades. Se vale o Oscar, porém, é uma questão polêmica que talvez nunca seja totalmente esclarecida.