ORGULHOSA DEMAIS, FRÁGIL DEMAIS
Era uma vez uma menina descendente de gregos acima do peso, desengonçada, com a pele cheia de espinhas e que vivia como a sombra da irmã mais velha e mais bonita. Apesar de ser a preferida do pai, era constantemente humilhada pela mãe, ambiciosa e cruel. Um belo dia, no entanto, sua mãe descobriu que a garotinha tinha um talento a ser explorado: uma belíssima voz, capaz de entoar as mais sensacionais árias de óperas internacionais. Disposta a ganhar dinheiro com a garganta da menina, ela deixa o marido em Nova York e vai para a Grécia, onde, depois de muito trabalho e sacrifícios, a gordinha sem graça transmuta-se em uma diva, cantando e encantando milhares de pessoas.
Pode parecer um conto de fadas mas o que foi descrito acima é uma história real, ou pelo menos a primeira parte de uma história real. A grega acima do peso que virou diva da ópera é ninguém menos que Maria Callas, a mais festejada - com razão, diga-se de passagem - cantora lírica da história. E o livro "Orgulhosa demais, frágil demais" (Ed. Record) conta, em forma de romance, não só sua trajetória rumo ao sucesso e a unanimidade mundial mas principalmente sua derrocada pessoal, causada justamente pelo sentimento que ela cantava melhor do que ninguém: o amor.
Já famosa, já sendo A Callas, Maria apaixonou-se (de verdade, de ficar de quatro) pelo armador grego Aristóteles Onassis, com idade para ser seu pai, nem um pouco atraente, de modos rudes e sem maiores instruções. Por amor a ele, sujeitou-se a humilhações impensadas, praticamente abandonou a carreira, foi obrigada a enterrar o filho natimorto em um cemitério de subúrbio sem registrar com o nome do pai e testemunhou o casamento de seu grande amor (que nunca havia falado em casamento com ela) com Jacqueline Kennedy.
Sem sombra de dúvida, a história de Maria Callas pedia um bom livro. A biografia escrita por Arianna Stassinopoulos Hutchinson, editada pela Cia das Letras, está esgotada e analisava, como o subtítulo já anunciava, "a mulher por trás do mito", fugindo do sensacionalismo que uma vida como a da divina Callas parece clamar. O livro do jornalista e escritor Alfonso Signorini, no entanto, conta a história por outro viés. Através do acesso a cartas e documentos inéditos, ele narra o caminho da cantora pela vida em forma de ficção, com diálogos inventados para preencher lacunas e uma escrita simplista e nunca empolgante. Em alguns momentos, tem-se a impressão de que "Orgulhosa demais, frágil demais" é um romance de Sidney Sheldon, tamanho o constrangimento de ler coisas como "apertou com toda a força o travesseiro que estava embaixo dos seus rins, impeliu a bacia, facilitando a penetração, e gritou. O primeiro orgasmo de sua vida."
Para se ter acesso a uma das mais fascinantes vidas do século passado vale a pena ler "Orgulhosa demais, frágil demais." Mas a divina Callas merecia coisa muito melhor.